“Tudo é culpa da mãe”, costumam dizer por aí. Parece interessante e confortável, portanto, jogar nas costas dos progenitores tudo o que não funciona da forma que eu gostaria que funcionasse, em se tratando da minha existência. Cito como um exemplo trivial o fato de eu ter 21 anos e estar lutando bravamente para parar de roer as unhas. Tudo seria mais fácil se minha mãe tivesse colocado pimenta nos meus dedos quando eu tinha 4 anos e comecei a roê-las, mas não. Roídas elas vivem até hoje e é óbvio que isso não é culpa da minha falta de tomar tenência na vida, mas sim, da minha mãe, que não agiu enquanto era tempo.
Era mais ou menos em torno disso que meus pensamentos rondavam enquanto eu apanhava horrores em minha primeira aula de jazz, no fim do dia de ontem. Vejam bem: eu nunca tive os genes da dança. Culpa de quem? Dos meus pais, é claro, que não souberam unir as melhores características possíveis na hora de produzir a minha pessoa. Vamos concordar então que genética não é tudo na vida de uma pessoa, e perdoá-los por esse fato, já que ao menos eles fizeram o favor de me mandar com os olhos azuis que eu tanto amo. Encerramos o assunto da genética então, decidindo que os genes não são tudo. Sendo assim, porque os meus digníssimos pais não facilitaram a minha vida quando viram que eu era uma desritimada, tendo o insight de me obrigar a fazer ballet desde o útero? Não é possível que anos de ballet clássico não teriam me feito tomar jeito. Minha professora de expressão corporal no teatro, que agora ministra as tais aulas de jazz, me disse que meu andeor é maravilhoso, e que eu perdi anos importantes da minha vida sem estar numa aula de ballet. Eu fiquei assistindo a galera arrasando na aula enquanto eu apanhava pra acertar os passos básicos e lamentava a falta de atitude dos meus pais. Custava me matricular quando eu tinha 3 anos? Eu teria pagado menos mico na aula de hoje.
Afora o desespero na aula de jazz, vivo pensando que minha mãe com a minha idade devia muito bem saber cozinhar, e insiste em dizer que com menos tempo de vida do que eu tenho hoje, ela fazia muito mais coisas de útil que eu. Pois sim, se ela tivesse me colocado aos 15 anos na frente do fogão e me obrigado a aprender a fazer arroz em troca de não passar fome, hoje eu poderia ser uma mestre cuca. Se eu morrer solteira só porque não sei fritar um mero ovo, a culpa certamente é dela. Além disso, minha alimentação não é digna de respeito. Adoro carboidratos e fujo do feijão sempre que posso. Brócolis? Viro a cara só de pensar num prato disso. Culpa de quem? Da minha mãe, que não conseguiu cumprir a tarefa de fazer a filha aprender a comer verduras. E essa falta de vergonha na cara de culpar os pais por tudo o que não faço de certo? Culpa dos próprios, é lógico, que não conseguiram nem me ensinar a assumir meus defeitos!
Do mesmo modo que é confortável culpar os pais pelas minhas incapacidades e péssimas escolhas, é extremamente fácil pensar que eu faria tudo diferente. Em questão de segundos olho pra galera que sabe dançar lindamente e penso que minha filha vai ser matriculada no ballet tão logo completar seu primeiro ano de idade. Pode não saber falar, mas vai saber dançar, ah se vai. Além disso, deixarei de castigo se roer as unhas. E vai aprender a amar brócolis nem que seja na marra. Nas horas vagas, vai jogar um vôlei, porque se eu não sou atleta olímpica hoje, a culpa, claro, também é dos meus pais. Meus filhos serão estrelas. Comerão de tudo. Cozinharão. Falarão 10 línguas. Conseguirão dançar todos os ritmos já inventados, e talvez recebam prêmios pela invenção de algum ritmo novo. Aliás, cada um de meus filhos receberá um prêmio Nobel de uma categoria diferente. Quero criar um time de crianças exímias em qualquer atividade. E aí, com certeza, eles culparão a mãe pela falta de liberdade na vida. E eu culparei a minha, novamente, por não ter conseguindo me ensinar a criar um filho direito. Errar é coisa de filho. E colocar a culpa nos pais é absolutamente conveniente.
Fui eu que escrevi esse texto???? Culpo meus pais por tudo. Por que diabos não me colocaram no ballet? Por que me deixaram abandonar o jazz? Por que não me obrigaram a fazer aulas de piano? Certamente eu seria uma pessoa melhor. Certamente eu entenderia mais da vida. E certamente meus filhos vão achar que eu fiz tudo errado também.
ResponderExcluirBeijo! <3
HAHAHAHAH, ai Analu..
ResponderExcluirQuem sabe teus pais não tiveram esse pensamento de "fazer diferente" quando te tiveram e fizeram tudo ao contrário da educação que os pais deles deram (levando em conta que eles tiveram uma educação rígida, como essa que tu quer dar para os teus filhos, cof cof)?
Mas é óbvio que é mais fácil culpar nossos pais. É bem mais simples, e nos tira várias preocupações da cabeça. HAHAHAH. Pobre pais. Um dia seremos nós no lugar deles...
Beijo! Te amo. <3
Pensava que eu era a única a querer revolucionar a vida da minha filha fazendo ela virar uma mini mente brilhante, capaz de fazer tudo lindamente. Hahaha
ResponderExcluirSempre juro pra mim mesma que vou fazer tudo (ok, vai, quase tudo) diferente dos meus pais. Realmente, culpar os pais é muito conveniente!
Você é incrível, e se estava achando que das sete crônicas apenas uma precisava prestar você é louca (culpa da Tia Mônica!). Amei, simplesmente, hahaha, quero um livro de crônicas da Máfia depois.
ResponderExcluirAmo você!
Suas pernas tem o formato de pernas de bailarina, sabia? Eu acho que você vai se dar bem no jazz, é só largar o seu encabulamento e esse complexo de "não sei" e se jogar! Você sempre acaba arrasando naquilo que decide fazer, a dança não vai ser diferente! E se não vai ser diferente, também não vai ser diferente com nenhuma dessas outras coisas. Porque do mesmo jeito que é culpa dos seus pais você não saber nada disso, também é culpa deles você ser uma pivetinha insistente e esforçada que não descansa até atingir aquilo que colocou na cabeça.
ResponderExcluirTe amo <3
Adorei o texto, me identifiquei bastante e sempre culpo meus pais por quase tudo, mas sei que eles querem só o meu bem e agradeço por tudo que fazem por mim, os amo muito. Parabéns pelo maravilhoso blog. Queria te convidar para visitar o meu blog e se gostar siga para ajudar na divulgação para que novos leitores possam conhecê-lo e desfrutar das postagens lá publicadas.
ResponderExcluirUm super beijo e fique com Deus! Blog - Julia no País das Maravilhas
Ai que texto ótimo! <3
ResponderExcluirQuando eu tinha uns 10 anos, convenci minha mãe a me deixar sair da natação, e acho que foi uma das conquistas que mais me deixou feliz na vida, porque eu odiava com todas as minhas forças fazer natação. E aí tinha a Anaisa, que fez natação até os 13, e eu lembro como ela sofria toda segunda, quarta e sexta, que às vezes ela chorava quando chegava na aula por simplesmente não suportar fazer natação, mas ter que fazer porque a mãe dela obrigava.
Lembrei disso num dia que brinquei que minhas filhas iam fazer ballé e iam fazer piano, e pensei nelas chorando no telefone com as amigas da escola contando que odeiam aquilo com todas as forças mas a mãe as obriga. Que baque, amiga, que baque na minha vida. Quis abraçar minha mãe e pedir desculpas por ter ido emburrada para a natação todos aqueles anos e agradecer, porque nossa, que bom que eu aprendi a nadar, né? É claro que ela não fazia aquilo por mal e eu resmungava TANTO!
(Mas ainda culpo minha mãe por não ter me colocado na aula de piano só porque era na sexta feira e eu dizia que tinha que ter um dia para brincar de manhã e ver desenhos)
beijos
Analu,
ResponderExcluirEu até a incentivei presenteando-lhe com uma roupinha de bailarina. Lembra-se? Vc a vestia e saia pela rua, fantasiada, na maior alegria.
Vc é linda e maravilhosa sendo do jeito que é.
Bjs
Olhe, sinto desfazer seu prazer, mas eu mantenho as unhas roídas também. E lhes digo mais: ela - a minha mãe - colocou pimenta sim nas minhas enquanto criança. Não adiantou. Eu até que passo uns seis meses (foi minha maior vitória de abstinência), mas se descasca o esmalte ou uma pelezinha qualquer... pronto! SObre dançar, eu fui ao balé e aulas de dança quando criança também, mas de nada adiantou... nesse aspecto, tenho que assumir sozinha minha "incompetência"...rs E quanto a fazer diferente com os filhos, não é utópico pra mim, eu tenho feito muita coisa diferente do que meus pais fizeram... rs Um cheiro.
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