quinta-feira, 14 de março de 2013

Antropologia da adolescência

Terminei meu horário de trabalho hoje e fui esperar meu pai me buscar. Fui até a varandinha e sentei no banco vermelho. Eu, minha bolsa e meu livro da Clarice. E ali eu fiquei. Ouvindo o vento, o silêncio, e o que Clarice estava afim de dizer.

De repente brotou um turbilhão de vozes, uma mais alta que a outra, e saiu uma porção de adolescentes (uns 8, mas adolescente faz barulho), todas meninas, que fizeram uma rodinha por ali e começaram a conversar. Conheço todas de vista, com algumas já bati altos papos, mas vieram me cumprimentar e voltaram pra sua rodinha. Eu desisti da Clarice, porque o barulho externo estava maior que o interno, peguei meu Candy Crush Saga e fiquei me divertindo com as cores das balinhas enquanto ouvia os papos.

Adolescente é uma categoria muito particular de ser humano, né? São vivos por demais, têm sede de vida por demais, são alegres por demais, e tristes por demais também. E naquele momento aquelas quase dez meninas estavam empolgadíssimas, e falavam fazendo gestos, usando gírias, rebolando e falando de cinema. Adolescentes, em grupo, de pé, na porta da escola, falando alto. Tão leve. Uma delas disse que a mãe estava chegando e foi pro lado de fora do portão, enquanto as outras resolveram falar de viagens. Quando uma disse que queria ir pra Rússia, e então a que estava no portão falou: “– Meu ex namorado era russo! Quero dizer, era grego!” e então todas as outras correram pra saber as histórias do namorado grego.

E eu ri. Ri sozinha, do lado de minha Clarice Lispector, pensando nisso tudo aí. Pensando nos intervalos da escola, no tempo que eles se chamavam recreio. Pensei nas rodinhas, nas pequenas intrigas, nas azarações, nas gargalhadas. Pensei em como a gente aproveitava bem aquele recreio de 20 minutos. Falávamos, gritávamos, achávamos que éramos o máximo.

Adolescente é um ser engraçado. Passa a manhã acompanhado dos amigos, tendo a certeza de que é o dono do mundo. Fala sobre o futuro com uma propriedade que nenhuma pessoa de outra faixa etária consegue atingir. De tarde, em casa, descobrem no facebook que o amor da vida delas está provavelmente namorando outra, porque deixou um coraçãozinho na timeline. E então ligam chorando pra melhor amiga pra contar. E sofrem. Sofrem com uma certeza absoluta de que suas vidas acabaram. Sendo a certeza de uma alegria desmedida ou de uma tristeza sem fim, uma coisa é certa: Adolescentes sempre têm certeza de ter certeza de tudo. (E certamente arranjam essa máscara fortíssima para poder esconder que a única certeza que têm é a de que não têm como terem certeza de nada.)

Eu costumava ser aquela adolescente sem lugar nenhum no mundo. Uma daquelas que não sabe quem é na vida, e que não acha nada legal esse lugar entre a infância e a idade adulta. Sentia saudades da infância, e ao mesmo tempo, queria desesperadamente ser adulta. Essa era eu. E hoje, sentada naquele banco abraçada com as palavras introspectivas de Clarice, tudo o que eu queria era voltar pra viver só mais um dia no meio daquela certeza, mesmo que ela fosse a certeza de não ter certeza de nada, enquanto falávamos alto no recreio, comíamos bala e reclamávamos de frio só para os meninos tirarem seus casacos e colocarem em volta de nós. Aqueles casacos nos faziam as mulheres mais poderosas do mundo, e faziam deles os mais perfeitos cavalheiros. Nós nos aninhávamos nas roupas grandes e fazíamos caras de dengosas, e eles empinavam o queixinho com uma cara de: – Te protejo de tudo, Baby.

Bons tempos, esses, onde eu tinha certeza de que aos 20 teria uma vida impreterivelmente perfeita. Aos 20, eu lembro que a vida aos 15 não era perfeita, e a única certeza que tenho, é de que ela também não vai ser perfeita aos 25. Mas que pode ser boa, mesmo assim.

teens

12 comentários:

  1. Texto fantástico, amiga! Eu acompanho isso de perto porque, você sabe, tenho um espécime bem característico da Aborrecentelandia aqui em casa. Hahaha!

    E, falando por mim, sinto a maior falta do ensino médio. Não sinto falta das espinhas nem da insegurança nem de matemática (ou de física), mas morro de saudade da despreocupação. E das preocupações tolas. Fase linda essa. E passa tão depressa!


    Te amo!

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  2. Analu,

    Gostei demais da forma como você foi construindo o seu texto. Na escola onde faço aula de inglês, sempre passo por situações parecidas e é muito engraçado observar adolescentes em grupo. É realmente como você disse. Eles vivem demais, são felizes demais, tristes demais. Vivem intensamente, como se não houvesse amanhã.

    Sinceramente falando, não queria, por nada nesse mundo voltar aos meus 15 anos. Se pudesse, queria ter a vida dos 15 com a "maturidade" dos 23. Aí sim a vida seria muito boa, né? ahahha

    Texto muito bonito, muito reflexivo e - por que não? -nostálgico!

    Parabéns!

    Beijos,

    Michas
    http://michasborges.blogspot.com

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  3. Ai amiga, eu acho que tenho algum problema, porque não me sentia muito adolescente quando eu era adolescente, sabe? De certa forma, não sei se abandonei essa fase por completo pra falar dela no passado mas, ao mesmo tempo, quando penso nessa época de rir histericamente e chorar como se o mundo fosse acabar, lembro dos meus 12, 13, 14 anos. Não completamente adolescente, mas longe de ser criança.

    Não sei o que fiz de mim dos 15 aos 17, juro pra você.

    E ainda chamo o intervalo de recreio, porque sim.

    Adorei demais o texto <3

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  4. Amei o texto!

    Realmente... eu fui uma adolescente atípica no que diz respeito a ser barulhenta, enturmada e coisas do gênero. Mas em outros aspectos, era adolescente mais típica da vida... todos os sentimentos no maior grau de intensidade possível, essa era eu. Ainda sou um pouco, pensando bem.... Enfim. Eu realmente sinto saudade da sensação que tinha naquela época, de saber exatamente o que eu queria para a minha vida, ainda que parecesse distante de alcançar. Agora não sei mais...

    Beijos.

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  5. Eu, como tenho pavor de pensar que estou envelhecendo, quado era adolescente eu só queria saber de curtir minha idade. E olha, era tão incrível a meu ver, que eu nunca quis sair daquela fase. E hoje só penso que seria sensacional se eu pudesse, por um dia, voltar a ser adolescente. Fico olhando para o meu irmão, que tem 17 [quase saindo da adolescência já!!], e morro de vontade de dar umas sacudidas nele e fazer ele viver a melhor parte da vida! Ele é desses adolescentes que ficam na frente do computador. Aff.
    Beijo. <3

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  6. Acho que fui uma adolescente muito atípica. Raramente eu saía de casa, tinha pouquíssimos amigos e ainda tomava conta da minha irmã. Sinceramente, não sinto falta dessa época. Nem da faculdade.

    Prefiro minha vida aos 25, principalmente por ela ter seguido caminhos que jamais imaginei.

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  7. Analu, posso afirmar sem medo de ser feliz: fui adolescente muito diferente do padrão. Claro que tinha meus momentos de gritinhos e grupos barulhentos, mas, no geral, eu sempre fui quieta e na minha. Não digo que era uma estranha, mas sempre gostei de ficar de fora das bagunças e picuinhas. A adolescência foi relativamente tranquila pra mim - bem, pelo menos até chegar o temido vestibular. XD

    E o finalzinho do seu texto é basicamente aquilo sobre o que surtei no outro dia... Só que eu parei de dramatizar e estou aceitando melhor os acontecimentos. Beijo!

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  8. Parece que tive um dejavú imenso lendo esse texto.

    Que saudade dos meus 13,14,15,16 e 17 anos! Eu era tão viva e disposta a fazer os outros rirem! E eu queria tanto voltar, só pra viver mais um dia. :'((( Era muito bom não ter noção de quão terrível pode ser o mundo, sabe? Do quão pesado e cheio de necessidades ele pode ser.
    Queria aquela vida fácil e leve de volta! Ai meu coração!

    Beijo :*

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  9. É engraçado ler esse texto. Sabe, eu ainda sou uma adolescente dessas intensas mesmo, de grupinhos, gritinhos, pulinhos e muita vontade de viver. Há alguns meses atrás, me sentiria ofendida lendo esse texto, mas agora já adquiri maturidade o suficiente para entender que todo mundo já passou por essa fase e todo mundo vai deixar essa fase. E que fase, né? A mais difícil, mas, mesmo assim, a mais deliciosa. E como eu amo ainda ter tempo para aproveitá-la! Como é bom poder fazer meus pequenos escândalos, ter meus momentos de loucura e continuar sendo normal. E como é bom poder ficar sozinha e calada, sem ser encaminhada para um psicólogo. É realmente maravilhoso poder seu o que eu quiser, seja 8 ou 80, usando aquela mesma desculpa "é a adolescência".

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  10. Incrível ver como essa fase foi um dia desses, mas já parece que foi há um milhão de anos. Sou como a Tary: sinto falta nenhuma de física, de não poder chegar tarde em casa, de ter prova simulado aos domingos na escola. mas gente, que saudade da falta de preocupação. E, como fosse disse e eu nunca tinha parado pra pensar, que saudade de fazer os 20 minutos de intervalo (nunca chamei recreio, gente!) valerem como se fosse uma noitada inteira.
    Acho que vou gostar dos 25 assim como gostei dos 15. São fases definidas. Na primeira ao menos se espera que você já seja alguém, enquanto na segunda você ainda não é ninguém. Mas sabe o que me mata? A indecisão dos 20. Isso sim me enlouquece.
    Mas amei o seu texto. Me deu uma nostalgia de matar.
    Beijos <3

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  11. Ahhh a tenra idade quando você começa a descobrir o mundo, eu era bem assim toda feliz com meus 15 anos. E tudo ia ser melhor aos 20...

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  12. Aah, como me identifiquei com o texto. Bateu até um saudade, mesmo que eu ainda me considere uma adolescente, sindo que estou no processo de transição. Mas, de uma coisa eu sei. Aproveitei de mais os meus 13 aos 17 anos e me orgulho disso. :)

    Muito bom o texto, continue assim! Beijos

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