segunda-feira, 26 de maio de 2014

A era do espetáculo

Continuação do post passado

Uma vez, rodando pelo tumblr, encontrei uma frase que nunca mais esqueci. Ela dizia que nosso grande problema era basicamente o fato de que comparamos nossos bastidores com o espetáculo dos outros. Palmas. É uma forma mais evoluída da famosa máxima que diz que a grama do vizinho é sempre mais verde.

E isso é assim desde que o mundo é mundo. A vida do outro sempre parece melhor. Claro: só vemos a parte boa. Agora, se isso já era assim desde sempre, tudo foi astronomicamente potencializado com as tais das redes sociais. Todo mundo é feliz no facebook, menos você. Todo mundo está postando foto de praia no Instagram enquanto você está trabalhando na quarta-feira a tarde. Sábado a noite em casa? Deus te livre! Está todo mundo na balada se divertindo absurdos com um drink na mão e rodeado de amigos.

Milly Lacombe já publicou um texto maravilhoso na TPM, onde dizia que as lágrimas doloridas e os momentos angustiados, esses nunca iam parar no facebook. Pelo menos não se a gente não pensar em nenhum poema ou música que nos ajude a sofrer em público com estilo, claro. Isso não foi ela que disse, fui eu mesma. Mas enfim. Não é fácil viver na era do espetáculo.

E eu pensei tudo isso enquanto, no meio do desafio dos 100 dias, estava sentada na cama, com um livro infantil na mão, e minhas primas Anna e Nina. Uma de cada lado. Nós ríamos enquanto eu lia a história e elas apontavam as figuras. Pensei que eu estava me sentindo infinita naquele momento. Peguei o celular para fotografar e postar o meu momento feliz do dia. Não consegui a foto, e as meninas dispersaram. Levei um soco no estômago.

A ideia do projeto é muito boa. A intenção é incrível. A gente realmente tem momentos felizes em cada dia, e precisamos perceber que sempre existe uma razão para sorrir em um dia horrível. A questão é que é exatamente nesse momento que não estamos segurando a câmera.

As minhas fotos vinham sempre um pouco antes ou um pouco depois do melhor momento. Invariavelmente. Mesmo as fotos dos momentos felizes no Rio de Janeiro, com minhas amigas. Fotografei muito, porque queria poder ver as fotos e sorrir de novo depois. Mas nada que foi fotografado vai chegar aos pés do momento onde as câmeras estavam guardadas e nós todas corremos juntas em direção ao mar como se nunca o tivéssemos visto na vida. Nunca.

Nenhuma das fotos que eu tirei do meu afilhado mostram um momento tão incrível como quando ele jogou os bracinhos para mim. Nenhuma foto em que eu estava aninhada na cama, no meu edredom, será tão reconfortante quanto o momento do dia onde eu, de banho tomado, me atirei nos lençóis e estiquei as pernas. As fotos estão sempre um momento antes. Ou depois. E digo que o projeto foi realmente positivo: Para eu perceber que a vida é pior do que a gente mostra em nosso Instagram. Mas é muito melhor, também. Não tem filtro que seja melhor que um sorriso verdadeiro. E não tem #selfie que capture uma priminha segurando na sua bochecha e dizendo que você é linda. A felicidade está nas pequenas coisas sim! Principalmente nas frações de segundo em que elas não tem como ser fotografadas.

Para finalizar o post, coloco minha última foto do projeto, onde estou vivendo meu 100º momento feliz. Nela, eu comemoro o fim do projeto, o fato de eu ter conseguido chegar ao fim, e o fato de ter conseguido analisá-lo dessa forma. Ah sim: estou segurando um toblerone. Preciso dizer que momento onde eu abri o chocolate e comi foi muito mais feliz que o momento da foto!

toble

PS: Sou uma eterna apaixonada por fotografias e registro de momentos. Toda essa reflexão não vai me fazer parar de fotografar. Mas foi interessante. Tentarei, pelo menos, não parar de ler com minhas priminhas para isso.

PS2: Já pensou que maravilha o mundo se todos tivéssemos fotógrafos à nossa disposição? Assim os momentos infinitos seriam fotografados, pois não teríamos que parar para pensar na foto.

18 comentários:

  1. Lindo texto, Ana! Daqueles que a gente pensa: "poxa, verdade! e eu nunca tinha reparado nisso antes!". A vida é isso mesmo. O essencial é invisível aos olhos e por isso é impossível fotografa-los :)

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  2. Amiga, fiquei sem palavras com as suas reflexões. Amei cada segundinho do texto, tanto que você foi parar nesse mural (e o que dizer dessa bichice de compartilharmos textos uma da outra no mesmo fim de semana?) <3

    Tô com tanto receio de dar spoiler do meu post nesse comentário que talvez eu deva escrever esse texto de uma vez, mas em resumo, eu concordo contigo que os momentos felizes não são mostrados com exatidão ao mundo. Até porque estamos muito ocupadas VIVENDO e sendo gratas por aqueles pequenos instantes que renovam nossa fé.

    Seria incrível ter um fotógrafo à nossa disposição, mas aí ficaríamos preocupadas com tantas outras coisas supérfluas! Quantas fotos espontâneas de momentos lindos deixamos escondidas porque o cabelo está fora do lugar?
    São coisas para se pensar. Talvez o único registro fiel da felicidade seja o da nossa memória. Queria uma máquina de tranformar lembrança em fotografia, isso sim <3

    Te amo muito!

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  3. Você bem sabe que essa reflexão dos espetáculos e dos bastidores é uma das minhas preferidas. Sou eternamente grata por você ter me apresentado a ela, já que a da grama já tinha usado o potencial dela.
    Tem uma música do John Mayer que fala bem sobre isso, o nome é 3x5. A gente tá super acostumada a tentar gravar um bom momento pra sempre, mas sempre me pergunto se tentar eternizar aquilo não me faz perder muito tempo. Meus amigos costumam dizer que temos poucas fotos, até o dia em que percebemos que isso só é verdade porque estamos muito ocupados sendo felizes. Mas é claro que quando sobra tempo pra fotografar, é mais do que válido. Ainda mais quando a fotografia é uma das suas paixões.
    Beijo <3 E ouça a música.

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  4. Queria ter conseguido terminar esse projeto, mas abandonei sem muito remorso. É como você disse: não dá pra captar o momento exato. Nunca dá.

    Ontem fiz altas reflexões desse tipo, mas elas estavam me levando pro fundo do poço porque eu estava querendo comparar as minhas frações de felicidade diária com o instagram dos outros que é lotado de fotos divertidas e de pessoas felizes. Pra quê, né? Às vezes penso em deletar o INXTA porque vez ou outra me pego sendo descuidada e dando ibope pro espetáculo dos outros.

    Há muito o que se pensar e refletir. E seu texto vai me ajudar muito quando eu pegar pra relê-lo. <3 Obrigada por ser uma escritora incrível.

    Beijos, nalu! <3

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  5. Está certissima, e é sempre bom lembrar disso. Meu professor de português do ensino médio costumava dizer que se a gente precisa tirar tanta foto é porque sabe que vai esquecer depois. Eu discordo, eu acho que a gente fotografa pra poder reviver e pra poder dividir com os outros. Mas os melhores momentos realmente nunca estão lá. Acho que todo mundo devia ter um fotógrafo particular (tipo um escravo? rs), e assim a gente teria o melhor dos dois mundos. Beijos <3

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  6. Amiga,
    Que texto maravilhoso! Quando vi a tal da Nine postando no Facebook, eu não imaginava que fosse amar tanto. A gente vive MESMO na era do espetáculo — e digo isso por mim mesma. E fico muito, muito feliz que você consiga me mostrar esse outro lado da moeda, que mesmo os momentos felizes nunca serão tão felizes quanto se mostram nas fotografias por aí.
    Te amo!
    Beijos

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  7. Que texto lindo!

    Concordo com o que você falou. Eu adoro fotografia, mas eu sou péssima fazendo. Sempre me atiro nos efeitos pra tentar salvar uma foto meia boca.

    O problema é que grande maioria das coisas boas passam batido porque a gente nem dá muita olhada. Eu, por exemplo, cairia na mesmice de fotografar as mesmas coisas quase sempre porque não há muito de diferente no que me faz feliz (e no que não faz também).

    Adorei o texto. Espero que um dia eu consiga completar o "meme".

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  8. "Eu fotografo para não esquecer..." e para ter momentos para lembrar. Gosto de fotografar momentos mas não aquelas fotos sociais... se ninguém tiver olhando a câmera com o sorriso amarelo melhor.

    Penso em fazer o projeto 365/365 mas fico com medo de largar de mão... o projeto.

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  9. Lindo texto, Analu! Você é uma das minhas filósofas favoritas!
    Realmente, a vida parece muito melhor sem a exposição que somos obrigados a ter nas redes sociais..
    Adorei o fato de você postar, não apenas o início do desafio, mas o fim. Já ouvi dizer: "Não importa como algo começa, mas sim como termina". Isso me inspirou!

    Sinto falta de ser comentador assíduo aqui no Blog, mas prometo aparecer com mais frequência...
    Você também nunca mais apareceu no meu, né? rs!

    Espero que esteja bem! Torço muito por você!
    Aguardo sua visita!
    Bjs

    http://www.opierrotmalamado.blogspot.com

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  10. Amiga! <3

    Tudo que você disse é verdade e eu concordo muito. Aconteceu a mesma coisa comigo durante o projeto, e o fato de eu não ter chegado ao fim ~você sabe porque~ também não anulou o fato de que ele, de alguma forma, me ajudou muito a perceber tudo de bom que acontecia comigo todos os dias.

    Já era automático, pra mim, chegar ao fim do dia, pensar nas coisas boas e fotografá-las (caso não tivesse tirado uma foto durante). Mesmo depois de parar de postar, eu fazia essa reflexão e passei a anotar tudo de bom em um caderninho. O resultado foram 52 linhas de coisas que me fizeram sorrir no momento em que aconteceram e quando li.

    Talvez essa coisa toda seja exatamente sobre isso: criar o hábito de perceber, dia após dia, as pequenas coisas que fazem nossos olhos brilharem.

    Amo você de um tanto <3

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  11. Ai Banana, já conversamos tanto sobre isso que acho que qualquer coisa que eu disser vai ser redundante. Teu texto é completo e ótimo, não sei mais o que comentar. Na verdade, sei sim: a gente não chegou a falar desse ponto de que a felicidade nunca está propriamente nas fotos que a gente tira. Muito louco isso, né? Acho que inconscientemente pensava assim quando ficava rabugenta no encontrão com vocês tirando fotos o tempo inteiro, porque acho que quando a gente para pra registrar, a mágica do momento se perde. E não é louco que a gente tira fotos justamente na intenção de eternizar os momentos? Tem uma música do Wilco que eu adoro muito, ela chama Pot Kettle Black. Um dos versos que mais se repete diz que "every moment is a little bit later" e eu não sei qual foi a ideia que motivou o cara a escrever isso, mas fico pensando que os ~~~momentos~~~ que a gente vive são sempre passados, porque ali, quando a gente está vivendo, se sentindo infinita e aquela coisa toda, ele não existe conscientemente. Não sei se isso fez algum sentido, mas juro que na minha cabeça essa é uma teoria concreta hahahaha

    Enfim, valeu super a pena aguardar ansiosamente por essas reflexões, amei os posts! E te amo amo amo <3

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  12. Sempre imagino que tudo seria muito mais fácil se nossos olhos fotografassem ao piscar e conseguissemos transferir os arquivos pra um computador depois. Acho que nenhuma foto que tirei/foi tirada de mim capturou o momento exato da infinitude e acho muito feliz esse fato, porque fico pensando que se eu estivesse com a câmera na mão, me obrigando a ser feliz só para espetacularizar, dificilmente eu teria vivido os momentos não fotografados. No fim, acho que os bastidores continuam a ser bem mais interessantes.
    Abraços!

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  13. Ainda bem que as coisas são assim! A questão é perceber esses momentos. Às vezes passamos muito apressados por eles, né? Também achei que esse projeto nos faz prestar mais atenção nos momentos felizes de cada dia, ainda que ele não seja bom. Super concordo quanto ao fotógrafo-24hs! Seria o máximo o/

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  14. Ana! Nunca parei pra pensar nisso,sabia? Realmente, os momentos felizes das fotos estão sempre atrasados, nunca no momento certinho, certinho.
    Mas que bom né, porque quer dizer que aquele sorriso ali do instagram, esconde um ainda maior e mais bonito. Louco né?
    E acho que dá sim, pra ser feliz todos os dias. Um dia ruim pode sim ter um momentozinho de felicidade que seja.
    Beijão.

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  15. Analu, meu bem, resumiu tudo que eu penso. Eu não conseguiria entrar nesse projeto porque acho que os momentos fotografados nunca serão tão bons quanto os vividos e por algum motivo estranho acho que as fotos invalidariam esses momentos (?)
    Porém acho lindo que esse projeto tem feito as pessoas perceberem que acontecem muito mais dessas pequenas alegrias do dia do que eles achavam. :)
    Beijo <3

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  16. Que texto flórida! A reflexão é tão sincera que até machuca. Realmente vivemos numa eterna atuação e nunca parecemos felizes o bastante. Gostei da reflexão mesmo! Desse lance de que os momentos bons não são fotografados. E te digo mais: quem tem a sorte de ser fotografado num momento feliz - nem antes, nem depois, mas NO momento - tem as melhores fotos da vida. Digo pelas minhas fotos de formatura, onde há vários registros de felicidade e nas fotos do meu casamento, onde a felicidade até transborda.

    Que bom seria se todos tivéssemos um fotógrafo à nossa disposição.

    Beijos!

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  17. Você conseguiu sintetizar tudo mto bem dizendo que o momento feliz não é o da foto e sim o que vem antes ou depois da foto. Quando estamos realmente sentindo, não podemos registrar. E mesmo que pudéssemos, a foto não traduziria a sensação, traduziria?
    Eu penso que existem coisas que ficam só para nós, e deve ser assim mesmo. Como os momentos que vc citou e que me fizeram lembrar de tantos momentos que foto nenhum pode registrar. E é assim que deve ser;
    Eu tô tentando o projeto 100happydays tardiamente, mas SEMPRE deixo O momento passar rs.

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