sexta-feira, 22 de maio de 2015

8. Dona Irma

Livremente inspirado nesse blog genial aqui

Vou confessar uma coisa pra vocês: eu tenho medo de envelhecer. Muito, pronto falei. Uma vez eu li em algum lugar que as pessoas tem que decidir, na vida, se elas tem mais medo de envelhecer ou de morrer novo porque, impreterivelmente, uma das duas coisas vai acontecer na sua vida.

Li em algum outro lugar, ainda uma outra vez (talvez tenha sido Antônio Prata? Não lembro) que a vida humana foi desenhada ao contrário. Deveríamos nascer idosos e ir passando por tudo ao inverso. Algo como nascer aposentado e curtindo devagar, viajar, pra depois trabalhar, aí então ser jovem, curtir a faculdade, depois brincar no jardim de infância e depois esperar o momento da morte aninhadinho em berço esplêndido. Seria realmente interessante – até porque, quando a gente chegasse na hora de morrer, não faríamos ideia do que é a morte. Bebês não pensam sobre esse assunto, e não ficarão com medo, afinal de contas.

Mas a questão é que a vida não foi feita assim e então precisamos encarar os fatos: vamos envelhecer (ou morrer jovens, bate na madeira). Eu sou meio metida a hipocondríaca, então você imagina: tenho dois dias seguidos de dor de cabeça e acho que vou morrer. Aí fico pensando no meu avô, que tem 92 anos. Fico pensando se a cada espirro que ele dá ele pensa que pode ser dessa vez. Tomara que ele não pense assim, senão deve ser uma vida muito amedrontada.

Tem aquela frase-inspiração-de-vida que eu adoro que diz que existem dois tipos de pessoa: as que não acreditam em milagres e as que acham que tudo na vida é um milagre. Vamos tentar fazer um paradoxo rapidão aqui então: acho que existem os idosos que ficam o tempo inteiro pensando que estão no fim da vida e que não dá tempo de fazer nada, e aqueles que, muito pelo contrário, acham que está exatamente na hora de fazer o que se quer fazer.

Quando fui fazer minha tatuagem, enquanto eu tremia de medo na sala de espera ouvindo o barulho da maquininha não fazia ideia de quem ia sair de lá. Isso mesmo: saiu uma senhorinha com uns 75 anos e uma rosa tatuada no pé. Feliz da vida que estava com sua nova invenção.

Na escola de artes cênicas onde eu trabalho acontece de tudo um pouco. No meio de tudo isso, acontece a Dona Irma. Patrimônio da escola, ela tem bolsa vitalícia para sempre porque é aluna há muito tempo. Acho que todo mundo sabe quem é a Dona Irma, e ela já adotou um monte de netos pelo caminho.

Uma vez eu fui contra-regra de uma peça que ela fazia. Tinha um momento onde tocava cancan no palco e todos os outros atores estavam em cena. Ficávamos eu, ela e minha amiga no camarim.  Quando menos esperávamos, Dona Irma começou a dançar cancan e dar risada enquanto ouvia a música. Precisei sentar no chão pra rir, porque não aguentei.

Não contente em ter passado dos 80, estar ativa no teatro, experimentar umas aulas de canto de vez em quando e dançar cancan no camarim, semana passada ela apareceu com o cabelo pink. Isso mesmo. Aqueles cachinhos brancos apareceram cor-de-rosa. Achei que eu não tinha como me apaixonar mais pela situação até que descobri que ela pintou com PAPEL CREPOM. By the way, era pra ter ficado vermelho, mas não deu certo, depois vou tentar de novo, disse ela. I rest my case.

Respeitem os idosos.
Eles são jovens a mais tempo que nós.
Lucão

9 comentários:

  1. Não tem idade certa para fazer "LOUCURAS" só precisa estar VIVO de corpo e alma leve...
    Lindo texto, Ana Lú!

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  2. Eu não consigo de deparar com algum texto teu, sem me encantar com ele, porque sempre acabo me vendo em suas palavras (calma, isso soou estranho, ah, mas você entendeu). Eu tenho um puta medo de envelhecer, na verdade nem é de envelhecer, e sim da vida estar passando, e eu estar tomando todos os caminhos errados. Por exemplo, tenho 17 anos, e estou louca porque posso não estar fazendo a faculdade certa, e ano que vem tentar outra pode ser tarde (idiota, eu sei). A verdade, é que essa neura atrapalha bastante na maior parte do tempo, e a ideia de nascermos idosos, me pareceria ótima, porém, será que nasceríamos com a maturidade e as experiências necessárias para irmos vivendo e fazermos as escolhas certas? Penso que de alguma forma, as coisas são certas do jeitinho mais torto que são, porque assim tem que ser. Amei, Ana!
    Beijos
    Desfocando Ideias

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  3. Eu penso demais sobre isso, se quando eu ficar mais velha vou pensar que todo dia pode ser o último de um jeito ruim. Acho que deve ser um bocado desesperador você ficar observando as pessoas da sua geração morrerem, o que inevitavelmente faz com que você se pergunte se provavelmente vai ser o próximo, e como vai ser quando chegar a sua vez. É um paradoxo mesmo, é horrível pensar que você pode morrer amanhã (e, convenhamos, QUALQUER UM pode morrer amanhã), mas é libertador (?) pra caramba também, porque foda-se vamos pintar o cabelo de papel crepom, afinal vamos todos morrer mesmo. Não é? Eu acho que é.

    (?)

    te amo!

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  4. Acho que foi Chaplin que disse isso de que a vida deveria ser ao contrário. E EU CONCORDO TANTO. Clinicamente diagnosticada com hipocondria e aprendendo a viver com isso, te digo que eu tenho muito medo das duas coisas: morrer jovem AND envelhecer. Evito falar muito do assunto, pois começo a ficar assustada de verdade e meu dia acabaria aqui mesmo, ENTÃO meu amor, vamos sempre pensar na Dona Irma e tentar ser um pouco como ela, ou então tentar pensar que nem Anna Vitória que acha a morte ~libertadora~, porque se não vamos enlouquecer de vez.
    Te amo! <3

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  5. Linda essa Dona Irma!
    Que leve lhe deve ser a vida.

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  6. Eu penso demais nisso também e olha, morro de medo de envelhecer. Acho muito que a vida tinha que acontecer ao contrário porque seria tão, tão mais fácil morrer sem ter uma real noção de que a vida acaba pra todo mundo. Um dia minha mãe me disse que quando eu morrer, eu não vou nem perder meu tempo pensando nisso, simplesmente vai acontecer e pronto, e nossa, como eu queria muito que fosse assim mesmo, mas agora parece apenas improvável demais que a vida vá acontecendo e eu esqueça que vou ter que morrer em algum momento. Espero muito que eu envelheça como dona Irma, que já amo sem nem conhecer, só pelo o que você contou aqui. Porque eu posso até morrer de medo de envelhecer, mas que é uma coisa linda, sem dúvida é.

    te amo <3

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  7. Eu tenho dificuldade em discutir esses assuntos pq, apesar de ter gente q pensa q eu sou durona, na verdade eu sou muito medrosa e há um mocado de coisa q me amedronta, e o medo de envelhecer ou morrer tá na lista, ou melhor medo de não saber aproveitar a vida e querer mudar quando for tarde demais (e eu sempre tenho a sensação de que não aproveito mesmo). Eu queria saber viver cada dia como se fosse o último, muito.
    Eu adoraria conhecer Dona Irma, ela poderia me ensinar um monte de coisa.

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  8. Se ficarmos pensando sempre no envelhecer, morte, deixamos de preocupar com a vida agora e isso inevitavelmente vai chegar, cabe a gente decidir como vamos administrar e viver isso.
    Que maravilhosa essa dona irma! Não sei, temos a mania (pelo menos eu e o galera ao meu redor) de pensar que a velhice é uma epoca parada, que não da para fazer nada alem de ficar sentada vendo tv.Quando fico sabendo de pessoas como a Dona Irma, eu sempre penso "Vou vou ser assim, vou aproveitar a vida mais ainda, igual a ela !!".

    Texto Maravilhoso :3

    Beijos

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  9. O que não tem remédio, remediado está. Não adianta a gente se preocupar com o dia da morte, porque não há nada que podemos fazer para impedi-lo de acontecer, certo? Eu eu meio que fico reafirmando isso pra ver se eu mesma me acalmo com meus medos. Quem não tem?

    Mas dona Irma, essa sabe das coisas. Sabe, não tenho medo de envelhecer. Agora tô mais perto de 40 do que de 30 e, sabe, tô AMANDO essa fase da vida! Acho que a gente nunca envelhece, lá dentro. Minha vó já me dizia isso. Morreu ano passado, 88 anos. Tenho plena certeza de que ela se sentia com 16 anos ainda. Como eu me sinto às vezes, como sei que minha mãe se sente.

    É isso, gente! A casca enruga, resseca, mas o interior tem que estar ativo, vivo, até o último dia! Eu acho um barato esses velhinhos que vivem como se fosse o último dia! Aqui tem um monte de cabelos coloridos e tatuagens também. :)

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