Esse post faz parte da postagem coletiva de março do RotaRoots
Vou começar dizendo que não, não estou um dia atrasada com esse post. Hoje, 9 de março, é dia da mulher. Amanhã, 10 de março, também será. 19 de abril, 30 de agosto, 11 de dezembro, todos os dias são dia da mulher e hoje eu resolvi aparecer para dizer que rosas são um gesto muito bonito. Posso ganhá-las no meu aniversário ou em um pedido de namoro, por exemplo, mas não por ser mulher. Por ser mulher eu só gostaria de ganhar direitos iguais mesmo.
Por ser mulher eu prefiro que parem de me passar cantadas nas ruas. Que parem de regular o tamanho de minha saia ou a quantidade de maquiagem que eu uso. Que parem de recriminar os palavrões que eu profiro quando estou afim e ao invés disso se preocupem em me dar crédito pelo conteúdo sobre o qual eu também sei falar.
Você já assistiu a esse discurso da Chimamanda Ngozi Adichie? Deveria.
Nele, entre outras coisas, ela conta que certa vez, ao sair de um restaurante com um amigo, abriu sua bolsa para dar a um flanelinha o seu próprio dinheiro, fruto de seu próprio trabalho. Ao receber o dinheiro de suas mãos, o flanelinha olhou para o amigo e disse: “– Obrigado, senhor.” Por que? Porque a sociedade está culturalmente incentivada a concluir que todo o dinheiro deve vir do homem. Porque é o homem que trabalha; o homem que é o líder. Nos dias de hoje parece piada. Infelizmente não é.
“De um modo literal, os homens comandam o mundo, e isso fez sentodo, há milhares de anos atrás. Porque então os seres humanos viviam em um mundo em que a força física era o atributo mais importante para a sobrevivência. A pessoa mais fisicamente forte era mais apta para a liderança, e os homens, em geral, são fisicamente mais fortes. [...] Mas hoje nós vivemos em um mundo completamente diferente. A pessoa mais apta para liderar não é a pessoa fisicamente mais forte. É a pessoa mais criativa, a pessoa mais inteligente, a pessoa mais inovadora, e não há hormônios para esses atributos. Um homem é tão apto quanto uma mulher para ser inteligente, para ser criativo, para ser inovador. Nós evoluímos, mas me parece que nossas ideias de gênero não evoluíram.”
Ainda em seu brilhante discurso ela diz que a sociedade acha trivial seguir esses padrões porque foi tudo culturalmente estabelecido. Mas cultura a gente muda. Seu exemplo é o de suas duas sobrinhas gêmeas que hoje têm uma vida linda que não seria possível há algumas décadas atrás onde gêmeos eram sacrificados ao nascer porque isso não tinha como ser algo aceitável e natural (?). A mesma coisa penso eu ao tentar conceber a polêmica que era, há não muitos anos, o fato de um casal ser formado por um negro e um branco. Cultura, concordo plenamente com Chimamanda, a gente muda sim. Principalmente para evoluir e aumentar os direitos de quem os merece.
O título de sua palestra diz que todos deveríamos ser feministas. Feminista. Ta aí um título polêmico e complicado. “São todas loucas, lésbicas, de sovaco cabeludo que querem andar nuas por aí”. Pode até ser que algumas de nós sejam assim, e daí? Nenhum problema, cada um é como quiser. A generalização sim é que, em qualquer âmbito, é extremamente problemática. Não sou louca (ao menos acho), não sou lésbica, não tenho sovaco cabeludo e não quero andar nua por aí, e vejam só, dizia que não era feminista.
Dizia que não era feminista mas sempre achei um absurdo o fato dos homens não lavarem a louça ou não trocarem as fraldas. Dizia que não era feminista mas sempre achei que o lugar das mulheres é onde elas quiserem. Dizia que não era feminista mas dei uma bronca na minha prima quando seu pai reclamou do comprimento de seu vestido e ela disse que quem tinha que se importar com isso era seu marido. Não é seu marido que tem que se importar com tamanho de vestido nenhum, Cínthia – eu disse – só quem pode se importar com isso é você.
Eu dizia que não era feminista, mas eu sou, porque, veja bem, eu acredito em direitos iguais entre os gêneros. Eu acredito que merecemos as mesmas chances, os mesmos salários, o mesmo respeito. Não quero e nem nunca quis ser maior do que ninguém (ou do que um homem) e nem mais importante. Só quero ser respeitada por ser igual.
Se não existe diferença nenhuma entre os gêneros? Claro que existe. Citando Chimamanda novamente digo que homens e mulheres são biologicamente diferentes, têm hormônios diferentes, orgãos diferentes e os homens geralmente são fisicamente mais fortes. As diferenças acabam aí , enquanto o mundo proclama que as mulheres se dão melhor ao preparar comida porque tem o gene da culinária (e não porque são arremessadas no fogão com maior frequência que os homens). Bem, sobre isso só faço questão de acrescentar que aqui em casa sou eu que abro a garrafinha de suco concentrado todos os dias porque meu primo não consegue. Depois que eu termino de abrir, ele vai lá e dosa a quantidade de açúcar porque eu sempre erro. Após essa singela amostra, te pergunto: quem é o forte e quem é o cozinheiro aqui, cara pálida?
Não faço tudo o que os homens fazem, mas tudo o que eu quiser fazer eu farei e ainda por cima de salto alto. Até xixi em pé, se eu realmente me esforçar. Não deve ser impossível. Ah, eles também, é claro, podem fazer tudo o que fazemos. Inclusive de salto alto, se preferirem. Não deixe os absurdos publicitários te enganarem: o poder de limpeza profunda está no amaciante, e não na mulher.
Sobre a mulher que eu sou e quero me tornar? Bom, eu sonho desde pequena em casar de vestido branco com o amor da minha vida e ter pelo menos meia dúzia dois filhos. Isso não me faz mulherzinha frente a causa de feminismo nenhuma e tampouco mulher de verdade frente à sociedade hipócrita: só me faz EU.
Uma sociedade ideal é aquela que dá a todos o pleno e indiscutível direito de escolha. Eu uso o meu para escolher quem sou e quero me tornar, sem barreiras e sem limites. Todos devem poder fazer o mesmo. Isso é feminismo.
“For most of history, anonymous was a woman”
Virgínia Woolf
Estamos todos cansados de mulheres anônimas.
Isso é feminismo.
Miga abri meu feed pra dar aquela olhadinha sem ler nada e quando percebi já estava imersa no teu texto. Delicia chegar em casa desmaiada e voltar a ter esperança no mundo com um texto desses. É incrível que mesmo tendo algum contato há um tempão, sempre descubro algo novo de ti ou das outras meninas que conheci por blog. E saber que tu pensa sobre isso do feminismo me deixa tão feliz ❤️❤️❤️❤️❤️❤️ Tenho uma prima que ainda diz que não é feminista, mas luta pelos direitos iguais entre gêneros e tem uma personalidade forte, ela sempre se impôs no que ela quis e ainda usa a palavra "feminazi ". E tens muita razão sobre você querer casar e ter 445 filhos, que isso não te faz mais ou menos feminista. Cada um é cada um e cada um sabe o que quer (vou até fazer um funk com essa frase). Beijos!
ResponderExcluirAmiga, eu queria pegar esse discurso da Chimamanda e panfletar por aí. Ela consegue dizer tanta coisa importante em poucas palavras <3 Amo a história de quando a chamaram de feminista pela primeira vez e ela percebeu que era algo considerado ruim. Amo a explicação para o termo FEMINISMO ser usado (e não "igualitarismo" ou qualquer outra coisa). Seria tão mágico se todos conhecessem esse discurso e lessem textos como o seu! São coisas assim que me fazem ter esperança na possibilidade de um futuro diferente para os nossos filhos, sabe? Gente que se revolta e luta do jeito que consegue. E fico tão feliz por ter pessoas como você na minha vida para discutir essas coisas e enxergar os absurdos que meio mundo não vê. Amo muito você e morro de orgulho, sempre <3
ResponderExcluirMeu amor, minha vida! Há quanto tempo não vinha te mimar, né? Pode me dar botinada (quer dizer, pode não, porque só trabalhamos com amor aqui, nada de violência).
ResponderExcluirQuando você me mandou aquele inbox, eu sabia que ia vir aqui e encontrar algo incrível, como tudo que você escreve. Apesar de já saber disso, quando comecei a ler seu texto, senti uma pontadinha de felicidade lá no fundinho do coração, e me deu uma baita vontade de sorrir. Primeiro, já te disse, mas repito aqui, e você mesma já disse, você não se dizia feminista. Eu entendo o porquê, de verdade. É como você disse: essa coisa do título "feminista" ainda é tabu, por incrível que pareça (e também porque as pessoas preferem ir pelo senso comum e crer que odiamos homens, ao invés de lerem sobre e entenderem que, o que mais queremos porque somos tão importantes quanto os homens, é a garantia de que teremos os mesmos direitos e seremos tratadas da mesma forma).
Esse discurso dela foi tão incrível que nem sei, e reler um dos melhores trechos aqui é tão bom (inclusive você citando Kate Nash por favor me abraça te amo). A melhor parte, pra mim, é quando você fala sobre você. Sobre seus doze filhos. Sobre você ter consciência do que é feminismo e que, mesmo querendo tudo aquilo que você quer, você não é menos feminista por isso. Obviamente fiquei emotiva porque Clara e eu fotografando seu parto, mas ignoremos esses detalhes por hora.
Só queria dizer que sim, eu tenho orgulho de você. De você ter escrito esse texto, de ter pensando em escrevê-lo. De ter lido você se chamar de feminista. Te amo num tanto que nem sei! <3
PS: vai que eu apareço aí de surpresa assim.
*pensado (sim, tô me corrigindo por comentário porque tenho TOC, desculpa).
ResponderExcluirQuando Chimamanda termina seu discurso, as pessoas se levantam para aplaudir. Só posso dizer que, nesse instante, minha vontade é levantar e aplaudir de pé seu post, suas palavras e, principalmente, essa pessoa incrível que você é. Eu me emociono muito quando leio essas coisas, não só porque ver mulheres foda falando sobre assuntos foda me fazem ter mais fé na vida, mas porque é nessas horas que eu tenho a real noção de que tenho pessoas incríveis ao meu redor, e que poder chamar uma pessoa dessas de amiga é, no mínimo, uma honra.
ResponderExcluirJá vi muita mulher que luta pela igualdade de gênero, mas que não se declara feminista e acho que isso, acima de tudo, mostra o quanto as pessoas, de uma forma geral, ainda precisam se esclarecer sobre o assunto. E é por isso que eu fico particularmente feliz quando vejo você escrevendo esse texto, jogando na cara de todo mundo que você é feminista sim, e que querer casar com o amor da sua vida e parir mil filhos (risos) não te diminuiu de forma alguma. Você é foda, e eu te amo de um tanto que você não tem ideia #hétera
<3
Bananica, que orgulhinho <3 Você falou e disse tudo muito bem. Esse discurso da Chimamanda é muito incrível mesmo, "comprei" no kindle e não canso de ler nunca porque ele é incrível. Quando chegar em casa vou assistir, porque nunca parei para ouvir ele, só li no papel, e acho que a gente sempre capta algo diferente.
ResponderExcluirDeixa eu parar de me desviar do assunto e voltar ao ponto só pra dizer que eu fico muito feliz quando eu vejo que a gente está crescendo, aprendendo coisas novas e perdendo o medo de defender aquilo que é certo e necessário. Espero que continuemos daí pra melhor.
Te amo muito <3
Vontade de levantar e aplaudir de pé. Porque terminei de ler com lágrimas nos olhos.
ResponderExcluirEu fico tão feliz que a gente esteja saindo do armário, amiga. Aprendendo coisas, estando mais consciente do mundo ao nosso redor, ainda que essa consciência seja da parte ruim dele. Afinal, se a gente vivesse num mundo bacana e igual pra todos, não teríamos esse ~despertar~ feminista nas nossas vidas, né?
ResponderExcluirTenho muito orgulho de você, desse texto e das coisas que você acredita, e fico felizona de te ver sem medo de se chamar de feminista, por saber que isso não tem nada a ver com ter que escolher coisas diferentes pra sua vida, mas sim por você poder escolhê-las mesmo assim. Seja o casamento, os doze filhos, e o comercial de margarina, ou qualquer vida louca e livre por aí.
E quer professora melhor que essa MARAVILHOSA da Chimamanda, aí? QUE MULHER!
beijos
te amo <3
Tô digitando com os pés porque com as mãos eu tô aplaudindo.
ResponderExcluirAnalu, meu deus, que post maravilhoso de se ler. Quando eu comecei a ler sobre feminismo e entender o que ele dizia, foi imediato me reconhecer como "feminista" e, a partir de então, comecei a corrigir posturas que, antes, eu julgava não serem ruins. Ainda tô firme nessa ~luta~, não só por concordar com muitos (!) pontos dela, mas porque me descobri mais confiante e mais certa de mim. Conheço um menino que ri quando eu digo que feminismo mudou a minha vida, mas é sério. Percebi que eu tenho voz e direito de ser quem eu quiser, usar o que eu quiser, beijar quem eu quiser, e isso teve um peso enorme na minha formação como pessoa e como mulher. Só consigo torcer para que esse movimento atinja cada vez mais pessoas e que mais mulheres tenham orgulho de falar que são feministas, e não receio, porque é muito bom fazer parte de tudo isso.
Amei o post. <3
Isso aí. Feminismo é sobre poder fazer o que bem quer sem ser "julgada" (tu pegou a ideia porque julgamento sempre vai ter, mas seria bom se não fosse não por gênero) (baby steps, they say).
ResponderExcluirEu e uma amiga minha brincamos muito sobre andar de bunda de fora porque a gente bem que curte um shortinho curto (e a gente usa mermo). O triste é tentar usar isso de dia, passando na frente de vários moços bem feitos. É constrangedor, e não deveria. Não por mim, eu amo os shorts, mas pelos olhares, pelos comentários. Pelo medo. Eu sinto medo. Eu ando na rua olhando pra trás porque mais do que o medo de ser assaltada, eu tenho medo de estupro. E também é triste ver na TV, nos filmes, na revista que só porque meu tamanho tá longe do 36 e minha bunda tá longe de ser firme e linda e sem celulite eu não deveria usar coisa curta, "porque meu corpo não é pra essas coisas". Ora pois: o corpo é meu, me deixem, demônios!
Digo hoje que não quero filhos, nem me vejo casada tão cedo. Digo hoje que quero ter minha vida, mandar no meu nariz e ter o meu dinheiro. Mas se amanhã eu quiser juntar as coisas e dividir as contas: que bom pra mim! Porque eu posso e não preciso dar explicação. Alguém já viu homem que sempre disse que queria ser solteiro ter que dar explicação quando se casa? Eu não vi.
Feminismo é bom. É necessário. E eu amo ver gente se declarando feminista. ♥
Beijos!
Obrigada pelo texto cheio de quotes que eu vou parafrasear quando entrar no assunto "feminismo" de novo.
ResponderExcluir"Não deixe os absurdos publicitários te enganarem: o poder de limpeza profunda está no amaciante, e não na mulher." ESSE FOI O MEU FAVORITO!
Beijos!