segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Queimando o livro

Se tem uma coisa que eu adoro caçar na literatura, essa coisa é a narrativa diferenciada. Em português claro, amo autor que inventa moda. Plots diferenciados já me chamam a atenção, mas se a mudança for na forma de narrativa a chance de eu buscar o livro é um tanto maior. Foi assim que eu comprei Cartas de amor aos mortos logo que ele começou a estourar por aqui, mesmo já tendo lido algumas resenhas não tão positivas por aí. Comprei e acabei deixando ele de lado na estante e fui lendo outras coisas, até que decidi que estava na hora.

Se eu pudesse usar apenas uma frase para defini-lo, essa frase seria: Minha Nossa Senhora do plot mal aproveitado. Porque, gente, cartas de amor aos mortos. Podia ter tanta coisa genial. Tanta coisa subjetiva. TANTOS mortos diferentes que gerassem diferentes significações por parte da personagem, mas não. Tudo bem que a personagem em questão tem 16 anos e diferente dos adolescentes de John Green, é uma adolescente bem típica, cheia das questões superficiais e quase nada existencialistas. O detalhe é que ela perdeu a irmã, e vive sua vida pensando nesse assunto pois tem certeza que teve culpa nessa morte.

O livro fala, em suma, de questões da adolescência: colégio, amizades, experimentações e encrencas familiares. Tudo isso, logicamente, com o toque a mais da morte de sua irmã. Embora eu tenha achado que o plot poderia ser brilhantemente mais explorado se a adolescente fosse existencialista e gênia OU se o personagem fosse bem mais velho, entendo que esse livro não foi escrito exatamente para a minha idade e respeito o fato de que talvez essa escrita não tenha sido mesmo feita para ME atrair, embora ache que o público que tenha sentido curiosidade foi justamente o público do YA. A autora não aproveitou um décimo da significação que poderia ter aproveitado com a escolha das pessoas mortas e a escrita das cartas, mas tudo bem, podemos seguir em frente. Achei os personagens muito mal explorados também: o esqueleto deles era bem bacana, e ela largou de mão a chance de desenvolvê-los, bem como aprofundar suas questões. Sobre a história de amor instântanea e mal fundamentada de Laurel e Sky também não vou comentar, porque eu não costumo ter grandes problemas em engolir histórias de amor que começam do nada, de forma que sei muito bem que o que me transtornou durante todo livro foi a ineficácia da autora em respeitar o gênero que ela mesma propôs.

Sua ideia é escrever um livro inteiro de cartas? Vai ser difícil, mas faça isso direito. Ava fez exatamente o contrário. O livro é inteirinho de “cartas”. Inteirinho. Não tem um trecho dele que não seja uma carta. E foi, ao meu ver, bem aí que a autora errou. Em Claros sinais de loucura, por exemplo, a proposta era escrever cartas para um personagem de seu livro favorito e a menina escrevia as cartas espaçadamente, complementando a história. Em Cartas de amor aos mortos, não. É só carta, carta e mais carta. E ao querer narrar a história de um livro inteiro só em cartas, a autora desvirtuou completamente o gênero proposto! Vocês já receberam cartas com mais de uma página de diálogos inteirinhos? Pois é, nem eu.

Além dos diálogos na íntegra, na grande maioria das cartas a autora ignorava totalmente a existência de um destinatário! São raríssimos os casos onde ela realmente aproveita a história do morto a quem a carta se dirige para contribuir com a história. Num geral, ela apenas jogava um motivo para a escolha do destinatário logo no início e depois se perdia completamente. Exemplo: "Querido Kut Cobain, hoje rasguei seu pôster da parede do quarto da minha irmã" e então ela mudava completamente de assunto. Isso começou a me irritar de tal maneira que toda vez que eu abria o livro eu acabava com vontade de tacar ele na parede. Muito fácil querer enganar o leitor prometendo uma narrativa diferenciada e apenas colocar: “Querida Elizabeth Bishop” no início e “beijos, Laurel” no fim para dizer que se tratam de cartas, sendo que o que vinha entre a dedicatória e a assinatura absolutamente não era uma carta.

A história do livro não é de todo ruim. Como eu disse, fala majoritariamente sobre adolescência, e não faz isso de uma forma que fique aquém a muitos livros de adolescentes que vemos por aí. Além disso, o livro fala de morte e de abuso sexual, o que, por definição, seria um ponto positivo a mais por propor o debate de assuntos mais sérios. O livro poderia ser 3 estrelas beirando 4 se Ava não tivesse subestimado totalmente a inteligência do leitor crítico e inventado uma narrativa por cartas que ela absolutamente não conseguiu cumprir. Acho que o que mais me irritou foi o fato de ter passado o livro todo me sentindo enganada. Quando eu compro um livro de cartas eu quero ler cartas e não uma narrativa fantasiada com beijinhos no fim de cada capítulo. É pedir muito?

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

E nessa loucura de dizer que não te quero

                                                                                                                                                            Esse post faz parte do meme  de setembro do Rotaroots 

Quando eu era pequena, karokê para mim era símbolo de festa de aniversário particular. A pessoa alugava o aparelho, os microfones, instalava na própria teve e voi la, passava-se o dia – quiçá o final de semana todo – cantando.

Durante uma época da minha vida, mais ou menos dos 9 aos 11, meus pais tinham um casal de amigos cujos pais da moça tinham um sítio em uma cidade a mais ou menos 2 horas de São Paulo. Passávamos longos feriados lá. Tinha piscina, fogão a lenha para fazer pizza e, impreterivelmente, se alugava um aparelho de karaokê. Fazíamos maratona. E a primeira coisa que me vêm à cabeça quando lembro disso era do Guto (o moço do casal) gritando:

- Não é possível que vocês vão cantar Falamansa de novo.

Quanto mais ele fingia reclamar, mais cantávamos Falamansa em looping. A música preferida do momento era o Xote dos Milagres, seguida sempre por Rindo a toa. Fora isso, eu sempre cantava Maria Chiquinha, e amava a parte que dizia “- o resto? Pode deixar que eu aproveito!” sem entender absolutamente a malícia da frase. Que tempos, senhoras e senhores.

 Um tanto mais velha, minha amiga marcou o aniversário dela num karaokê. Isso para mim era um universo distante, de televisão e filmes, onde alguém ficava bêbado, subia no palco e cantava. Nunca imaginei que era um lugar divertidíssimo e acessível a ~pessoas normais~ - não, é claro, que eu e meus amigos fôssemos normais.

Essa experiência já contava com o palco – o que me deixou roxa de vergonha para pegar o microfone pela primeira vez na noite, mesmo sabendo que depois da primeira a coisa anda. Mesmo assim, a sala do karaokê estava reservada para a aniversariante, de forma que o máximo de vergonha que tive foi alguns outros poucos amigos dela que eu não conhecia. Minha turma era a maioria, e entre nós não tinha grilo.

A outra história é a que acabou me ensinando a minha teoria sobre karokês – teoria essa que rege a minha ideia de lista de músicas para karaokê que o meme do RotaRoots sugere. No primeiro encontrão da máfia nossa programação contava com bienal do livro e karaokê de noite. E lá estávamos, no karaokê, em uma sala com mais dois grupos. Nós, em torno de 13 meninas barulhentas e eufóricas. Eles, dois grupos de mais ou menos 8 pessoas, conversando normalmente e.... se levando a sério demais.

Nós ríamos umas das outras, cantávamos tudo em coro, principalmente Assererrê e aquela do Kid Abelha, com toda a inserção necessária de trocadilhos que vocês conhecem muito bem. Cantávamos sertanejo e dançávamos forró. Inventávamos, inclusive, o espanhol que não sabíamos para cantar Shakira. Tudo isso revezando palco e microfone com os outros grupos que... cantavam solos de (juro) músicas dramáticas do Evanescence. Óbvio que teve muito mais coisa, mais o fato que mais me vem à cabeça quando eu lembro da cantoria dos outros grupos era do moço, sozinho no palco, com cara de sofredor apaixonado, cantando My Immortal e, adivinhem... se levando a sério demais.

Foi ali que eu descobri que se você quer se levar a sério demais você deve cantar no próprio chuveiro ou na aula de canto. Karaokê não é lugar para isso. Karokê é para fazer folia, mesmo que seja em cima de sofrimento. Está chateadíssimo e desiludido? Cante evidências! Abuse das caretas, convide os amigos para sofrer juntos. Música de karokê é música que todo mundo sabe cantar. É música que vai envolver a sala toda. Essa é a graça.

Participação especial da menina do Agora moro na Lua

E é por isso que na minha visão, a lista de músicas que não devem faltar em um karaokê – quer você esteja com o microfone na mão ou apenas apoiando o coro – é uma coletânea de todas as coisas erradíssimas e divertidas que eu fui citando acima: Falamansa e seus xotes, Sandy e seus chicletes apaixonados, Balão Mágico, Lua de Cristal, Estoy aqui querendo-te e tudo mais o que for desse gênero. E perdoem-me a repetição, mas preciso deixar bem claro: Uma noite de karaokê sem Evidências é uma noite de karaokê jogada no lixo. A propósito: chega de mentiras, de negar o meu desejo, eu te quero mais que tudo, eu preciso do teu beijo, eu te entrego a minha vida pra você fazer o que quiser de mim, só quero ouvir você dizer que sim! Diz que é verdtá bom, parei.

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Ensaio sobre a fita crepe

Já quero deixar bem claro no início do texto que eu não faço a menor ideia do que é um ensaio. Absolutamente não compreendo esse gênero textual – e talvez exatamente por isso o ache extremamente intelectual e sofisticado, de modo que resolvi usá-lo no título do post apenas por esse motivo (#maturidade). Sou uma fraude, mas pelo menos me entrego logo de cara. Findo este informe, creio que posso prosseguir com meu assunto sem causar desilusões a ninguém.

Quando eu estava no colégio em que passei grande parte do meu ensino fundamental e médio, tínhamos anualmente uma feira cultural. Muito bonita e interessante para quem visita – totalmente tenebrosa para os alunos que tem que organizá-la. Com o passar dos anos eu fui aprendendo a remar e ficando mais calma, mas no meu primeiro ano de feira eu jurei que ia acabar infartando, tamanha a quantidade de pesadelos que tive com o tal do moinho hidráulico (sim) que um grupo de 4 crianças pessoas de 12 anos tinha que montar (SIM). ENFIM, o ponto não é esse. O ponto é que lembro que no dia da feira precisaríamos pregar cartazes e outros itens de decoração em nosso stand e eu pedi para minha mãe que me emprestasse a fita lá de casa. A resposta que se seguiu foi:

- Está aqui a fita crepe. E ACHO BOM ELA VOLTAR PARA CASA COM VOCÊ.

The thing is: trata-se de mim. Eu, Ana Luísa Bussular Marques, muito prazer, que passava o ano escolar inteirinho repondo ao estojo os itens perdidos. Borrachas que rolavam no chão e nunca mais apareciam, apontadores, lapiseiras, caixas de grafite novinhas, a maldita da tesoura (que minha mãe reclamava mais, porque custava mais caro) e coisas afins. Com essa simples introdução vocês já entenderam que a fita crepe não voltou para casa. Na verdade, eu até voltei com uma fita crepe para casa – que não era a nossa, pois estava no finzinho, toda amassada e meio úmida, porque eu a encontrei no chão da sala ao fim do dia. A da minha mãe era branquinha, limpinha e novinha.

Ou todos os alunos da classe resolveram usar a fita da minha mãe ou eu realmente peguei a de alguém por engano na hora de voltar para casa, mas o fato é que minha mãe não se convenceu com aquilo que eu devolvi para ela e eu passei HORAS escutando sobre a minha falta de cuidado com as coisas. Mas cacete, pensava eu, era só uma porcaria de uma fita crepe.

Dez anos depois de tudo isso eu fico feliz em comunicar à Analu do passado que sim, sobrevivemos a todas as feiras culturais seguintes (e possivelmente perdemos mais algumas fitas crepes pelo caminho) e que agora estamos formadas em jornalismo e trabalhando em uma instituição de ensino. E o que isso tem a ver? Então. Dentro das minhas funções no trabalho está a atualização de todos os murais da escola. Colar avisos, colar cartazes, colar fotos por aí e coisas do gênero. Ainda não encontraram o ponto? Eu esclareço: A fita crepe.

Aos 12 anos eu não entendi o sermão da minha mãe porque para mim a fita crepe era algo que estava perfeitamente ok de se perder por aí. Por favor vai, não era assim uma tesoura. Era só uma fita crepe! Era só comprar outra e podíamos sobreviver muito que bem até essa compra. Aos 22, tendo que dar conta da manutenção de murais, eu só peço ao Senhor que perdoe a menina de 12 que subestimava a falta da fita crepe - ela não fazia ideia do que estava dizendo. Hoje a fita crepe se tornou o meu maior tesouro. E todos os alunos e funcionários dessa escola descobriram isso.

A maior alegria da minha vida é quando fazem pedido à papelaria e eu ganho uma fita crepe novinha. A maior tristeza é quando, geralmente mísero 01 dia depois dela chegar, alguém me aparece com cara de cãozinho abandonado  na minha mesa e pede a minha fita emprestada. Se tem uma frase que eu aprendi a ODIAR ouvir nessa vida essa frase é: “Tem fita crepe para me emprestar?”. Não sei porque perguntam. Todo mundo sabe que eu tenho fita crepe. E é esse o problema. Porque eu consigo fazer manha, consigo enrolar, consigo dizer que não deveria emprestar mas no fim não consigo lidar com a pessoa me pedindo e eu negando, de forma que eu sempre empresto. E eu sempre digo: 

- Quero essa fita de volta em 5 minutos contados no relógio. 

E o fato é que ela só volta em 30% dos casos*. 

Já tentei dizer que cobraria por pedaços. Comecei eu mesma a cortar o pedaço e dar na mão da pessoa. Cogitei até, vejam, ir atrás da pessoa com a fita crepe no pulso bradando um “Se quiser minha fita crepe vai ter que me levar junto”. (Qualquer semelhança com isso aqui é mera coincidência).

Trouxe você, querido leitor, até aqui para dizer que esse texto (ou melhor, esse ~ensaio~) não tem conclusão nenhuma. Aliás, tem sim: quando você é adulto você descobre que fita crepe is the new estojo com as 30 cores da caneta de cheirinho, o que em português claro quer dizer “o símbolo maior da ostentação pessoal”. Eu tenho minha própria fita crepe, e todo mundo me ama quando precisa dela. E eu sempre empresto, de forma que acabo sem, chorando no pé da responsável pelo setor de compras para que ela faça logo um novo pedido à papelaria. É um looping infinito e por isso eu acredito que tenha o direito de encerrar esse post fazendo um apelo utópico da maior importância: um mundo ideal seria um mundo onde cada pessoa teria seu próprio rolo de fita crepe e andaria com ele no pulso, para não precisar pedir a do colega emprestada nem em casos de extrema urgência.


Pela sua atenção, obrigada.

* Dado numérico concluído após chute deliberado longas análises estatísticas e diversos cálculos

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Nosso lar

Via de regra eu detesto os anúncios do Youtube. Eles são uma sarna quando você se prepara psicologicamente para ouvir uma música fossa e ele toca um samba de repente (ou vice-e-versa). Eu sempre pulo o anúncio, irritadíssima, quando acabam os 5 segundos obrigatórios.

Dia desses teve um que eu não pulei. Era, se não me engano, da Natura, e eu achei deveras criativo. Nele as pessoas falavam: “Meu nome é Fulana e eu tenho 32 anos”. O que me intrigou e fez com que eu continuasse assistindo sem passar era o fato de que as pessoas absolutamente não tinham a idade que diziam ter. Ou a propaganda era de algum creme milagroso ou a ideia do publicitário era genial. Fiquei feliz quando vi que era a segunda opção.

Na verdade, a idade que as pessoas diziam ter era a idade de alguma outra situação em suas vidas e só após todas terem se apresentado é que elas revelavam esse detalhe. A primeira fulana tinha 32 anos de casada. A outra, 24 anos de amizade com a melhor amiga. Um outro ainda, 3 anos de empresa.

A sacada não foi genial? Nossa vida realmente não pode ser medida somente pela nossa idade biológica: tem muitas outras idades em jogo. Idades de histórias que vão nos completando.

Eu, por exemplo, tenho 22 anos de nascida. Tenho quase 19 anos de irmã. Tenho quase 5 anos de Curitiba e tenho 7 meses de formada em jornalismo. Tenho 18 anos de leitura na babagem, 6 anos e 11 meses sem uma das minhas avós, 10 anos que virei mocinha. E hoje tenho exatamente 3 anos da amizade mais linda que eu já construí.

Em 15 de setembro de 2011 eu e uma amiga selecionamos umas blogueiras que conhecíamos, cliquei no botão “criar grupo” no Facebook e minimamente imaginei o quanto minha vida seria diferente 3 anos depois. Fica muito difícil exemplificar e contar em detalhes – quem está no meio entende tudo. Só o que posso deixar claro é que a pessoa que eu era em 2011 não faz ideia de quem eu virei em 2014. A pessoa que criou aquele grupo em 2011, na maior inocência e vontade de fazer memes não fazia a menor ideia de como a sua vida ganharia mais cor. A vida é muito melhor quando a gente pode desvendá-la bem acompanhada. É muito melhor quando a gente não é só um, e sim, A Gente.  É muito melhor quando, onde quer que estejamos, contamos com certeza de que temos um lar. Ou ainda melhor: de que somos um lar. E lar, minha gente, não preciso nem repetir: sabemos muito bem que nunca significou espaço físico e sim encontro de almas.

Andar acompanhado de ti faz meu coração se sentir melhor

Obrigada!

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Plict Ploct Stil, a porta se abriu!


Se você foi criança nos anos 90 e curtia uma vibe tv cultura você vai entender (ou ao menos imaginar) a torrente de emoções que eu senti ao visitar a exposição do Castelo Ra Tim Bum no MIS em São Paulo.



Antes de mais nada, me sinto na obrigação de avisar a você, querido leitor que não está por dentro do assunto, que essa exposição está merecendo até camisetinhas no estilo Rock in Rio dizendo “EXPOSIÇÃO DO CASTELO RATIMBUM, EU FUI” porque olha, não tá fácil.

Desde que eu ouvi falar do assunto que eu comecei a quicar de vontade. Não demorou muito para eu decidisse que era inaceitável perder essa chance e logo marquei uma viagem para São Paulo com esse intuito. 6 de setembro, esse era o dia. Sairíamos de Curitiba de madrugadinha, pegaríamos a estrada e por volta de 9/10 da manhã chegaríamos e iríamos direto para a fila. Os planos já deram uma leve desandada quando, no dia 4, minha amiga me mandou uma mensagem dizendo que no dia 6 só entraria quem estivesse com ingresso comprado pela internet, eles não venderiam na hora. Tive uma leve síncope nervosa, mas reagendamos nossos planos para o dia 7, domingo, e ficaria tudo bem.

Quase não ficou. Os planos eram ir para a fila às 8h mas por motivos de balada no dia anterior só conseguimos levantar às 9h. Chegamos lá às 9h40 e a fila rodava 3 esquinas. Foi entrarmos nela e o produtor da exposição veio gritar que não tinha mais ingresso para quem estava depois de uma tal placa. Óbvio que estávamos depois. Como boa adulta determinada que sou, coloquei minha viola no saco e liguei para minha mãe, com os olhos cheios, pedindo para ela me buscar que tinha dado errado. Tão logo entramos no carro minha mãe esbravejou que não tínhamos ido até ali atoa e que entraríamos na fila quer tivéssemos garantia de ingresso quer não tivéssemos.

Entre monitores extremamente grossos, visitantes desistentes e até um projeto de cambista que nos cobrou 10 reais por um adesivo (os adesivos garantiam a compra do ingresso), saímos de lá perto das 11 da manhã faceiríssimas com nossos quatro ingressos na mão para o horário das 19h.

17h45 já estávamos nós lá de novo, dessa vez para a fila da entrada. Eram 18h52 quando recebemos instruções, a fila começou a andar e a magia começou. Entre maquetes do castelo, porta com porteiro e tudo, abertura tocando e personagens falando eu juro que não sei dizer o que eu senti lá dentro. Eu apenas sorria, pulava, queria tirar foto com tudo e levar tudo para casa.  Se você está muito curioso com o que pode encontrar por lá, eu repito a frase de minha amiga Anna sobre o assunto e vou logo te adiantando: Tudo o que você imaginar tem.

E tem mesmo. Tem a biblioteca com o gato. Tem a sala de música com todas as caixinhas e circo e telas. Tem a lareira com os marionetes que falam outras línguas, tem a oficina do Doutor Víctor e o laboratório do Tíbio e do Perônio. Tem a Penélope, tem o ratinho que corre, tem os dedinhos que contam e na cozinha tem até a música do Lava uma mão lava a outra lava uma que está ecoando na minha cabeça até agora. Aquilo está tão perfeito e tão bem montadinho que eu absolutamente me recuso a acreditar que é uma exposição comum com prazo para acabar; ao meu ver tinha que ser igual, sei lá, o Museu da Estrela, que tem para sempre e que cada vez que eu fosse a São Paulo eu poderia dar uma passada no Castelo Ra Tim Bum para matar as saudades – que nem eu imaginava serem tão grandes.

Além de toda a magia que circunda o Castelo em si, confesso ter ficado ainda mais encantada ao sentir a sintonia das pessoas. Assim, claro que tinha pais recentes e animados trazendo suas crianças que nem sabiam do que aquilo se tratava. Óbvio que tinha também aqueles mais perdidos que abraçavam a Adelaide chamando a família para tirar foto com o passarinho (?). Mas a maior parte, o grosso do negócio mesmo, era tipo eu. Que enchia os olhos quando olhava para o Mau e logo comentava da gargalhada fatal; que olhava para o Ratinho e saía cantando que tchau preguiça tchau sujeira adeus cheirinho de suor; que assobiava quando olhava para a Caipora e que entoava Enquanto isso no lustre do Castelo quando dava de cara com as fadinhas. Para mim, toda essa emoção conjunta se resume no moço barbado e animado que, do alto de seus, sei lá, 28 anos, estava com as bochechas rosas de alegria e sem conseguir parar de sorrir, dizia para a namorada: - Amor, venha ver o Bongô!

E foi assim. Foi assim que eu li sobre a exposição, me recusei a perder, quase fiquei sem ingresso mas consegui ir. Foi assim que eu entrei no quarto do Nino rodando no sofá (sim) e foi assim que eu tirei 128313 fotos em 1h30. Foi assim que eu arrepiei até a alma de tanta saudade de estar no meio daquilo tudo e foi ali que eu lembrei de jurar a mim mesma que meus filhos precisam assistir a série inteirinha – mesmo se quando eles nascerem já estivermos na 10ª edição 3D das Monster High ou do Ben 10. Eu juro. 


quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Stop the beauty madness

Esse post faz parte da Blogagem Coletiva de setembro do Rotaroots 

Quando eu e minha irmã éramos pequenas, minha mãe sempre nos maquiava nas festas juninas. Como eu amava essa data. Ganhava pintinhas, sombra nos olhos e um batom vermelho. Era uma vez no ano. Dentro de casa, eu via minha mãe se maquiar só quando íamos ao aniversário de alguém e/ou sair para jantar a noite. Daquelas maquiagens de criança, provavelmente cheguei a ter alguma, mas minha irmã era tão alérgica que um dia se lambuzou com uma dessas, ficou inteira inchada e nunca mais essas coisas apareceram lá em casa.

Lembro de uma vez que eu tinha 11 anos, era de noite e estávamos indo para um aniversário. Minha mãe me chamou no banheiro e perguntou se eu queria passar uma sombra. Me senti adulta. No ano seguinte, minha amiga me chamou para fazer chapinha no meu cabelo. Feita a chapinha, ela pediu para passar um lápis no meu olho. Nunca aguentei nada dentro do meu olho e quando descobri que o lápis se passava do lado de dentro foi um calvário. Lembro até agora da gente sentada no sofá, ela vindo com o lápis e eu me encolhendo. Demoramos no mínimo meia hora para ela conseguir pintar – bem mal e mal – UM olho. Ficou tudo preto, borrado e esquisito. Jurei que nunca mais ia passar lápis.

Não demorou e a moda do lápis preto ganhou força na escola. Outra das minhas amigas passava muito bem, de forma que aprendi a deixar ela passar em mim. Quando ela levava o lápis para a escola, íamos para o banheiro, ela passava em mim e tudo não passava de uma brincadeira muito divertida. A partir daí, quando saíamos juntas, sempre deixava ela me maquiar. A parte mais legal de sair era quando nos arrumávamos.

Ilustrei o post com essas lembranças só para deixar bem claro que eu cresci achando que maquiagem era coisa que as mulheres adultas usavam para sair em ocasiões especiais e não faço ideia de em que momento do universo o mundo resolveu pensar todo de outra forma e as meninas começaram a usar maquiagem para viver, todos os dias.

Juro que quando comecei a ver pipocarem nos instagrans as legendas da tal da terça sem make eu dei risada e pensei que sério mesmo que as pessoas estão definindo um dia na semana para sair de casa sem se maquiar, meu Deus? Eu nunca me maquio!

Pronto. Confessei. Essa é a verdade dos fatos: pareço legal, mas gente, eu não me maquio cotidianamente e sou feliz assim, tirando momentos em que eu me revolto comigo mesma e meu sonho passa a ser ter paciência para me maquiar todo dia e andar sempre na linha.

Eu lembro de uma vez que fui de surpresa na casa de uma amiga minha e nós devíamos ter uns 16 anos. Eu cheguei lá e tomei um susto repentino: aquela era a cara da minha amiga? Nos conhecemos quando eu tinha 11 e ela 10 e a vida era leve e de cara limpa, mas tão logo começamos a crescer (e ela tentou passar lápis no meu olho) ela começou a se maquiar e nunca mais parou. Tomei um susto quando olhei pra ela aquele dia e a vi sem maquiagem, porque me toquei que não a via assim há muito tempo.

Cada um tem a sua relação com a maquiagem e não estou na posição de julgar ninguém. Como eu disse, eu também tenho os meus momentos de me julgar completamente errada de não fazer o mesmo que a maioria e sair parecendo uma boneca. Não posso julgar ninguém, mas posso dar uma julgada na sociedade que quase não me pegou, mas que aprisiona muitas mulheres todos os dias? Posso julgar sim. Posso julgar tudo isso porque se as pessoas inventaram uma terça sem make, para começo de conversa, é porque elas adoram ter um dia para sair de casa com o rosto leve sem ter que se esconder ou morrer de vergonha. E aqui eu reitero, não condeno absolutamente o uso diário da maquiagem por quem realmente ama fazer isso – mas duvido que a maioria não se sinta escrava dessa brincadeira e é isso que me incomoda. Quem foi que decidiu que sair de cara limpa é crime?

Passada um pouco a história da terça sem make, chegou ao meu contexto aquele desafio de postar uma foto de cara limpa na internet. A Anna foi a primeira amiga minha que eu vi fazer – e não me convidou. Fui tirar satisfações, porque sou dessas, e ela rebateu dizendo que eu nem usava maquiagem cotidianamente. Disse que não usava mesmo e ri, mas que obviamente as fotos que eu postava na internet tinham maquiagem ou pelo menos filtro de luz. Ela então voltou lá e me indicou para o negócio. Levantei a câmera, dei um sorriso, bati a foto e postei. Sem delongas ou preliminares – não tive que tirar nada, porque já estava sem maquiagem, e confesso que não fiquei com vergonha, tampouco.

Olhando as fotos de quem participou, percebi que a maioria das pessoas saía meio séria. Quando muito com um meio-sorriso. Eu, apesar de não ter mostrado os dentes, sorri normalmente, e cheguei a pensar – juro – se não tinha sido um truque para a foto ficar um pouco mais bonita e que eu tinha roubado (percebam). Logo espanei o pensamento pensando que o problema era postar foto com make (e filtro!) e não foto bonita. Meu sorriso, ao meu ver, deu conta da foto muito bem. E é por isso que eu acho que o estado de espírito é a maquiagem mais linda que temos para usar todos os dias.

Isso não é demagogia: todos temos nossos dias ótimos, nossos dias bons, nossos dias ruins e nossos dias péssimos. Eu durmo pouco, acordo com olheiras, passo o dia mau-humorada, olho no espelho e quero chorar. Ou eu posso também acordar animada, com as mesmas olheiras, mas cheia de vontade de viver, passar o dia sorrindo, olhar no espelho e pensar “nossa, como eu estou bem hoje”. Tem dias que eu quero me jogar inteira fora. Tem dias que eu casaria com meu reflexo em Vegas. Todas temos esses dias. E o que eu mais queria para todo mundo é que todo mundo aprendesse a casar consigo mesma em Vegas sem precisar de rímel para isso – se você não estiver afim de passar rímel naquele dia!

Quando eu estou muito bem maquiada, não nego que me sinto linda: tiro selfies, olho por horas no espelho, sorrio para o reflexo, fico encantada. Enrolo para tirar a maquiagem: quero me ver linda por mais tempo. Quem não quer? A diferença é que quando eu pego o algodão, encho ele de demaquilante e arranco aqueles quilos a mais do meu rosto, eu não tenho receio nenhum de sair na rua e tudo o que eu queria com essa ideia do Stop Beauty Madness é que fosse assim para todo mundo.

Na minha foto do desafio, muita gente comentou: “Linda de qualquer jeito!”. Eu ri. Ri porque postar a foto de cara lavada numa brincadeira do facebook, com um texto motivacional e abraçando um movimento foi muito fácil – para mim e para todos os que comentaram. Ri mais ainda porque uma parte clara das pessoas que comentou dizendo que eu era linda de qualquer jeito são as mesmas pessoas que vivem me dizendo, quando eu estou saindo de casa: “CUSTA passar um lápis e um rímel?”. Custa sim: minha vontade de acordar mais cedo e ficar parada na frente do espelho por mais tempo do que julgo necessário para a minha existência na maioria dos dias. Comentar na minha foto apoiando a causa é muito bacana, mas apoiar a causa quando vê que eu realmente sou adepta dela desde antes de ela existir, isso parece muito mais complicado para muitas das mulheres que me rodeiam. Logo que os comentários começaram, cheguei a pensar que era hipocrisia e dei gargalhadas. Agora, refletindo, pensei que o buraco é realmente mais embaixo, porque elas realmente se sentem apoiando a falta da maquiagem – mas não devem perceber que estão indo totalmente contra isso quando reclamam porque eu saio sem ela todo santo dia para ir encarar o mundo lá fora.

Uma causa dessas não se apoia só de vez em quando, só de brincadeira, só na internet. Se apoia de verdade. Se apoia treinando o olhar para achar as mulheres lindas (o que inclui você mesma) quando elas quiserem sair de cara limpa. Não é deixando de usar a sua maquiagem que você apoia – repito: se você gosta de usar, de se arrumar cuidadosamente toda manhã, nada mais digno com você mesma do que você fazer isso. Essa causa se apoia quando você deixa de ser escrava disso – se um dia você acordar sem estar afim de passar lápis, colega, não passa! Repita comigo: você não é obrigada. O cerne da causa toda – ao meu ver – é o mesmo cerne de quase todas as causas da humanidade: a liberdade de escolha. O poder de cada uma exercer a própria liberdade no dia que acordar sem vontade nenhuma de passar base.

Usemos delineador! Usemos rímel, usemos sombra, usemos corretivos! Usemos porque amamos essas incríveis invenções, mas única e exclusivamente porque amamos e porque é legal que elas nos deixem nos sentindo mais lindas - e não porque acreditamos que não somos capazes de ganharmos o mundo sem todas essas intervenções. A parte mais bonita de nós é, sempre, o que está embaixo. Vai por mim: se você tiver que escolher entre o batom e o sorriso, fique com o segundo. Ele é bem mais indispensável.