Meu quarto tem um espelho grande. Uma janela com dois vidros. 3 murais de foto feitos de vidro e 5 portas de armário (vejam só: de vidro!). Era tudo muito transparente e puro até que eu comprei canetas para escrever neles.
Achei que escreveria e desenharia para sempre, mas sou apegada. Escrevi quando comprei e nunca mais apaguei. No espelho tem meu trecho favorito de Florbela Espanca, já meio apagado pelo tempo. Mesmo assim, toda hora que eu me encaro no espelho ele me grita que eu devo saber me perder pra me encontrar.
Em uma das portas do armário tem, inteirinho, o Soneto da Fidelidade, de Vinícius. Que seja infinito enquanto dure. Ainda nessa mesma porta, Cazuza em dois trechos. Um de “Preciso dizer que te amo”. O outro que diz que seu amor é uma mentira que a minha vaidade quer.
Na porta do lado, Camões, insistindo e dizer que amor é dor que desatina sem doer. Na terceira porta, um coração, que minha prima desenhou em nome do meu afilhado, dizendo que me ama e que aquela porta é dele.
Na quarta porta, um desenho lindo da Couth, bobeirinhas que minha irmã escreveu, um trecho de John Green e um de Taylor Swift, todos falando de amor. A outra porta é dos amigos, e cada um rabisca o que quer. Na janela tinha Legião, mas o suor da chuva derreteu tudo, e eu coloquei Clarice Falcão no lugar pra minha janela se perguntar no meu lugar se nesse filme de romance vai ter beijo no final.
Não só virou base para as minhas quotes poéticas, meu quarto virou playground. Meus priminhos, que já curtiam o ambiente, o tem como o cômodo mais legal do universo, onde eles podem rabiscar o armário com canetas. Geralmente eles vem, fazem uns desenhos, uns rabiscos, eu delimito a área e depois taco álcool na bagunça e fica tudo bem.
Da última vez eu não prestei atenção. Mas além do coração com meu nome dentro e da bonequinha que eu não quis apagar, eles rabiscaram Cazuza, Taylor Swift e o mantra da máfia. Talvez tenha que ser assim. Talvez a gente tenha que ver o que fica, mesmo debaixo da bagunça, depois que os furacões passam.