Começo esse post assim. Suspirando. É um suspiro tão ambíguo. Tem aquele lado dele que mostra alívio. Alívio de ter cumprido um dever. Um dever delicioso, que acho que posso dizer que sim, foi muito bem cumprido por nós todos. O outro lado do suspiro, claro, é o de saudade. Uma saudade boa. Que eu sei que vai bater aqui na minha porta por um bom tempo.
Tentando seguir uma cronologia, na quarta-feira ganhamos as galharufas. Na quinta feira chegamos animados para um ensaio geral: Finalmente pisaríamos no palco. Carregamos tijolos, vestimos figurino, prendemos a lona da foto pela primeira vez. A Airen chegou correndo, às 20h30min da noite. Ela tinha marcado conosco às 19h, mas foi banca de uma outra turma, e a banca deles simplesmente não acabava nunca. Quando ela finalmente foi liberada, chegou correndo no teatro e gritando: Voltei pra vocês, amores!
Do jeito que ela entrou, terminou de olhar o cenário e disse: Ensaiem. E ensaiamos. Terminamos de ensaiar, todos pimpões, e então a Si, outra professora, que estava nos assistindo, disse simplesmente que estava faltando verdade. Disse que tinhamos um texto maravilhoso em mãos e não estávamos emocionando ninguém, porque não estávamos vendo aquilo que estávamos fazendo. Sentiu o balde de água fria no meio da cara? Nós sentimos.
Eu e a Bruna, que somos as rainhas do drama, entramos no camarim a ponto de cortar os pulsos, mas aí, é claro, Airen existe. Ela nos disse um monte de coisas, frisando o fato de que aquele era um ensaio técnico, e que não tínhamos nos aquecido psicologicamente. Ela falou, nos abraçou, beijou minha galharufa e disse: “Durma bem, minha flor. Até amanhã.”
Você dormiu? Eu não. Fiquei até as 3h da manhã procurando a porcaria da verdade. No outro dia, tínhamos marcado de nos encontrar no Cena Hum às 18h. Deu 16h e eu estava andando de um lado pro outro dentro de casa. Desisti. Me enfiei de cabeça no chuveiro, taquei figurino dentro da bolsa e me mandei pra escola. Cheguei lá dizendo que não tinha aguentado ficar em casa, quando vi que metade da minha turma tinha pensado o mesmo. A Airen tinha acabado de entrar na sala, e nos deu uma verdadeira aula de 1h sobre como o ensaio tinha sido técnico. Disse que já tínhamos achado a verdade há muito tempo, que ela tinha acompanhado tudo nos ensaios, e que não era hora de se desesperar. Depois das lindas palavras, começamos a nos arrumar, arrumamos cenário, nos abraçamos, pulamos no palco, sentimos as vibrações boas. No nosso cenário, tinham véus brancos esticados. Ainda não sabíamos a ideia da Airen em relação a eles. Depois de nos aquecermos e fazermos tudo o mais a que tínhamos direito, ela andou no palco até o véu central e disse: “Podem ocupar os lugares de vocês no palco, amados. Mas antes, inaugurem o cenário de vocês.” E então ela fez um rasgo no véu.
Essa foi a senha para nós 13 corrermos loucamente em direção aos véus e começarmos a rasgá-los loucamente. Quando nos sentíamos prontos, íamos sentando. Ela gritou um MERDA bem alto, entrou na cabine de direção, e mandou que abrissem as portas. Aí a magia aconteceu.
Não existiam mais a Ana, a Eloíse, a Bruna e o Murilo. Existiam os nossos personagens, somente. O que aconteceu naquele palco na sexta não dá pra ser mensurado. A Airen disse que assistir aquilo foi indescritível. Ela não tinha coragem de apagar a luz ao fim da peça, pois queria ficar vendo para sempre. Quando ela desceu da cabine chorando e dizendo que estava completamente apaixonada por nós, acho que finalmente entendemos que sim, a verdade estava o tempo todo ali, dentro de nós.
Diretora orgulhosa jogando beijinhos da cabine para os seus “filhotes”.
Depois, descobrimos que tinha simplesmente 120 pessoas naquele teatro para nos assistir. Nossa peça termina com o elenco virado de costas. Ouvimos o rompante de palmas e viramos pra frente. Ver aquele teatro lotado com tanta gente nos aplaudindo de pé foi maravilhoso. Mas não tão maravilhoso quanto ouvir os soluços do público enquanto nos apresentávamos. Alô, era um senhor drama! Tenso, denso e extremamente bem organizado. Coisas de Airen. Ver que estávamos fazendo direito foi inebriante. Chorou até quem prometeu que não ia chorar.
O sábado fez jus à lenda de que segundo dia é ruim. Foi ruim. Saímos chateados, mas a Airen disse que nós exageramos e cortamos os pulsos com muita facilidade. No domingo foi bom, mas nunca, nunca é como na estreia. Além disso, domingo foi a banca, que foi uma delícia. Quase 2h. Resolveram fazer em ordem alfabética, eu quase enfartei, mas aí a Sônia, professora da qual eu estava morrendo de medo, me emocionou. Disse que quando eu levantei e comecei a dar o texto ela percebeu o quanto eu me apaixonei pelo que estava fazendo, o quanto me envolvi, estudei, e resolvi que ia fazer direito. “Falhas existem, menina. Mas é lindo ver uma atriz tão jovem mergulhar tanto assim. Parabéns”. Segura as lágrimas, Ana Luísa. Com a Airen dizendo: “E como ela se envolveu!”, com aquele sorrisinho e a piscadinha cúmplice de sempre então, impossível. Passou. A peça inteira foi muito elogiada, desde cenário, iluminação, texto, até a perspicácia da diretora em dar para cada um exatamente o papel que cada um deveria fazer.
Nessa terça, último dia. Não só lotamos o teatro como nunca parava de entrar gente. Quando pensávamos que tinha acabado, aparecia alguém trazendo cadeiras a mais. Isso se deve a um nome no cartaz da peça: Airen Wormhoudt. Porque gente, Airen é um mito. A Ju definiu muito bem! Mas sendo a nossa digníssima professora um mito ou não, tinha muita gente naquele teatro. Gente que, mais uma vez, saiu chorando, fazendo questão de vir nos abraçar no palco, e falar o quanto tinha se emocionado. Foi o último dia. O muro saiu completamente torto. Mas foi o dia em que nos abraçamos, guardamos nossos tijolos, entregamos presentes, cartinhas, e saímos todos juntos, e mais um pedaço do público, pra um barzinho delicioso comemorar. Comemorar a nossa arte, comemorar o nosso brilho, comemorar o nosso amor, a nossa paixão. Ah sim, a paixão. Isso foi comentando pelo público em todos os dias, e foi muito frisado na banca, pelo diretor da escola: “É impressionante ver um elenco de 13 pessoas tão apaixonadas pelo que estavam fazendo. Os olhos de vocês brilhavam no palco, vocês realmente estavam entregues àquilo. Isso é muito bonito.” Sim. Pode ter faltado qualquer coisa no nosso trabalho. Mas paixão, ah não. Essa esteve presente em cada segundo. E ainda está. A paixão é o que fica. Muito além das fotos e lembranças incríveis. Que semestre maravilhoso.
- Seu coração é um tijolo!
- Mas ele bate por você.
Ah, e claro. Intensidade é intensidade! Com uma união incrível, uma diretora fantástica, um texto maravilhoso e um público lotado, é claro que essa foto tinha que aparecer no post. É óbvio que foi sem querer (e não, não fui eu que derrubei), mas…
Brindar é para fracos. Nós comemoramos arremessando a garrafa de whisky cênico no chão.
PS1: Fotos 1 e 2 tiradas pela nossa fotógrafa e amiga linda, Éri Buhrer.
PS2: Não, ainda não acabou. Falta o post de homenagem pra Airen e a carta para a Clara. Porque né, ela foi muito mais que um personagem durante esses 4 meses.