quarta-feira, 31 de julho de 2013

Sopre as velinhas, Harry

É que hoje é 31 de julho e eu lembrei do aniversário de 11 anos do Harry, quando ele olhou no relógio do Duda que tinha dado meia noite e soprou sozinho as velinhas que tinha desenhado de areia no chão. Meu coração se acalenta e se aperta ao saber de como tudo mudou daquele dia até agora. E de forma nenhuma isso mudou só pra ele. Mudou pra mim, e pra mais uma quantidade infinita de pessoas.

Eu tinha 8 anos quando Harry soprou aquela vela, e, sobretudo, não tinha a menor noção de como a existência dele faria a minha vida mais completa. Se existem mil motivos para eu viver uma nostalgia pré-nascimento e desejar ter nascido em outra época, Harry Potter é o que mais me faz agradecer ter nascido quando nasci. As pessoas de outras idades leram Harry Potter. As pessoas que nascem agora lerão também. Mas nenhuma geração vai ter a dádiva de VIVER Harry Potter como a minha geração viveu. Desde os meus 8 anos que eu fui obrigada a entender direitinho o que era ansiedade, e sobre como era difícil domá-la. Sempre tinha um livro ou filme pra esperar, e quando o último filme lançou eu chorei, supostamente “encerrando” uma fase da minha vida que nunca voltaria. Na verdade não tive que superar esse final, porque ele nunca aconteceu.

Harry Potter não se encerra. Harry Potter não é uma fase da sua vida. É uma parte da sua vida, marcada no peito e ponto final. Eu tenho 21 anos de vida, o que significam 15 de Harry Potter. E meu olho ainda não cansou de brilhar quando eu penso e falo sobre esse assunto. Não canso de viver as nostalgias de cada “primeira vez” com cada personagem, livro, ou filme. Não canso de olhar os livros na prateleira e fazer carinho nas suas capas. Não canso de pensar que isso tudo é muito real pra não existir. Existe sim, tá lá do outro lado da estação 9 ¾, e o que me resta mesmo é me conformar com meu azar de ter nascido trouxa com tanta paixão bruxa no peito.

Esses dias, vagando tardiamente no Pottermore, eu descobri o que meu coração desde sempre já sabia: Eu sou da Lufa-Lufa. E chorei lendo a carta de boas vindas à casa, que me disse que a Lufa-Lufa, além de ser a casa da lealdade, é a menor produtora de bruxos das trevas. Sempre soube que eu não tinha a bravura de um grifinório, mas sou consciente do meu coração leal e lufano. Chorei de novo quando meu amigo, também da Lufa-Lufa, abriu um sorriso enorme e me abraçou, e eu percebi que nosso abraço nunca antes foi tão verdadeiro e entregue. Harry Potter faz isso com as pessoas.

Harry Potter não é ficção, não é um livro, não é um filme, não é uma historinha. É uma parte intocável e intransferível da vida de muita gente. Uma parte que qualquer lembrança faz emocionar, arrancar sorrisos, provocar debates e até arrumar confusão. Eu já levantei da carteira na sala de aula da faculdade pra apontar o dedo na cara de uma menina que desdenhou de Harry Potter. Eu nunca levanto a voz em sala de aula, e naquele dia eu saí de lá querendo atacar a jugular da menina pra ela aprender que tem coisas que a gente não pensa, quanto mais verbaliza. Eu não sou obcecada pelas coisas que amo a ponto de desprezar e amargar minutos de ódio por quem fala mal do assunto. Gosto é gosto. Mas com Harry Potter é diferente. Harry Potter coloca no auge meu lado ferino. Fale de mim, ponha defeitos em mim, diga que eu sou tosca. Mas não faça isso com Harry Potter.

E nesse dia 31 de julho, mais do que mais uma declaração de amor, eu só queria dizer, de novo, obrigada. Na verdade, a JK Rowling, porque também é aniversário dela. E como outras milhões de pessoas pararam pra pensar em algum minuto desse dia e de todos os outros, preciso agradecer mais uma vez por ter feito a minha geração ser a mais sortuda de todas por poder viver Harry Potter. Obrigada por me ensinar muito mais sobre a vida e as pessoas do que qualquer livro didático. Muito obrigada por me ensinar a ser rebelde e ler Harry Potter escondido aos 10 anos quando minha mãe me mandava estudar. Obrigada por me ensinar que ler pode ser a melhor coisa do mundo. Por me ensinar que não é só porque as coisas acontecem na minha cabeça que elas não são reais. Obrigada por afirmar que não se deve ter pena dos mortos, e sim, dos vivos, sobretudo dos que vivem sem amor. E se alguém me pegar falando de Harry Potter aos 90 anos com os olhos cheios de água, e me perguntar: “Ainda falando disso?”, eu terei toda a honra, amor, e orgulho ao usar como referência um dos meus momentos favoritos e poder responder: “Always”.


domingo, 28 de julho de 2013

Dos comércios de bairro

São sempre nos dias de agenda totalmente lotada que acontecem os detalhes mais inusitados da semana. Nessa sexta-feira, por exemplo, na falta de uma reunião, eu tinha duas. Além disso, é o dia de mandar o informativo da escola, e por uma anedota do destino, eu, que sempre começo a editá-lo na quarta-feira, não tinha nem tocado no mesmo. Adicione a isso o fato de que eu precisava revelar 30 fotos para colocar no mural dando as boas vindas aos alunos e que era impossível ir até a gráfica de sempre porque o meu amigo esqueceu de ir trabalhar de carro.

Levantei da minha cadeira munida apenas de pen drive e carteira, agradeci aos deuses por estar fazendo um pouco de sol, apertei ainda mais o casaco com forro peludo e fui desbravar os contornos da escola em busca da papelaria que imprimisse minhas 30 fotos em folha sulfite em uma qualidade razoavelmente animadora e sem cobrar um dos meus rins.

Na primeira papelaria que fui, a impressora de tinta colorida estava “levemente estragada”, e o teste da impressão resultou e uma foto onde as pessoas tinham os rostos levemente esverdeados e tinham suas roupas cortadas por linhas amarelas. Melhor não. Resolvi cruzar os dedos e ir até a outra papelaria que conhecia, quase que na certeza da decepção. Lá não devem caber 5 clientes em pé, é óbvio que eles não imprimem nada. Mas fui. E quase sentei de alegria quando o mocinho me falou que imprimiam sim, e que custava R$1,50. Falei que eram 30 impressões, e ele me disse: “Sério? É que… vai demorar. Tipo, 1 minuto pra cada uma”. “Tudo bem, eu espero”, disse eu. Só que esse 1 minuto virou 2 e eu passei mais de 1h dentro da papelariazinha olhando a impressora caseira deles cuspir as minhas fotos. Que saíram numa qualidade linda, by the way.

Enquanto eu ficava ali, parada de pé, com a mão em cima do balcão, fiquei reparando no ar gostoso que tinha a tal da papelaria. Pequenininha, no meio da muvuca, na frente de um posto de gasolina e perto de uma lojinha de quinquilharias. 3 atendentes, que se revezavam nos atendimentos, e eu passei tanto tempo ali que os 3 me atendiam ao mesmo tempo. “Quer um café?” disse o mais velho, que tinha até um jeitinho de dono. Eu ri e disse que não precisava. “Um chocolate quente? Uma volta no shopping?” eu continuei rindo e dizendo que não. “Uma cadeira? Moça, é sério, você vai cansar”, ele disse. Enquanto isso a impressora respirava fundo para imprimir, sei lá, a minha foto número 4. “Tudo bem, só essa e mais 26, pensava eu”. E fiquei ali, analisando o cenário pitoresco que me cercava.

Aquela papelariazinha, no fim das contas, tem tudo. Até fita métrica e aparelho de fax. E eu não fui a única que me aliviei sorrindo quando consegui o que queria. A mocinha que foi procurar a fita crepe quase deu pulos de alegria, e o moço que tinha ido passar um fax quase estourou uma champagne. “Nós passamos sim, mas sabe, ninguém mais usa fax hoje em dia!”, disse o atendente, meio que jogando na cara do cliente, de um jeito simpático, que ele era um ultrapassado.

Enquanto minhas fotos saíam, comprei flags coloridas para marcar meus livros. Papeei no whatsapp com as minhas amigas, enquanto um senhorzinho que estava do meu lado pedindo xerox colocou a mão no meu ombro e disse: “meu Deus, menina, como você digita rápido nesse celular!” e depois ainda reafirmou para o atendente “olha quanta habilidade ela tem no teclado dessa coisa!”. Sorriu pra mim e perguntou se era um samsung. Eu disse que não, e ele perguntou se era um tablet. Eu disse que meu celular era grande mesmo, mas que não era um tablet. Ele perguntou se o que eu estava mandando eram torpedos, e eu disse que sim, porque não quis explicar o que era whatsapp. Mas morri de vontade de dar um abraço de “Feliz dia dos avós” nele.

Ele foi embora e eu continuei. Vi clientes de sempre zoarem pedindo as contas. Vi o atendente que tem cara de dono chamar as senhoras de meninas, que ficavam sorridentes. Enquanto isso ele contava em voz alta as minhas fotos e me perguntava de novo se eu não queria mesmo sentar.

Já eram 10 pras 4 quando consegui sair de lá, pensando que tinha meia hora para editar e enviar o informativo, pregar as fotos no mural, e ir para a primeira reunião. Saí correndo, mas saí feliz, porque tinha sol e porque me diverti na 1h30 que passei dentro da papelaria. Meu amigo colou as fotos no mural pra mim, fiz o informativo rapidinho e resolvi enviá-lo depois, entre uma reunião e outra. As reuniões foram rápida, o informativo foi enviado, e deu tudo certo. Sábado os alunos adoraram ver as fotos no mural. Eu olhava pra elas, lembrava da impressora demorando 2 minutos em cada uma, e ria sozinha pensando em como são incríveis esses pontos de comércio de bairro. Conhecer cliente pelo nome, vender fita métrica e mandar fax nos dias de hoje realmente não é pra qualquer estabelecimento.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Um bom escritor

Eu estava na Livraria Cultura do Shopping Villa Lobos, aquela antro maravilhoso de literatura, quando um vendedor parou do meu lado e começou a me falar apaixonadamente sobre livros, como se eu apaixonada o suficiente eu já não o fosse. Em certa altura da conversa ele pegou um exemplar de Moby Dick, com um milhão de páginas, e disse que você sabia que um escritor era realmente bom quando era capaz de escrever um calhamaço daqueles sobre baleias e ainda assim prender a atenção dos leitores.

Eu sei que é mais do que clichê “escritor” escrevendo sobre a falta do que escrever. Mas eu não consigo prender a atenção de ninguém escrevendo mil páginas sobre baleias, então não sou propriamente uma escritora e não vai ser clichê se eu reclamar de novo que eu não consigo escrever.

Falei pra minha amiga que não aguentava mais abrir esse blog pra mais uma filosofia de boteco. Antes ele era até equilibrado. Eu filosofava ali, e narrava fatos do cotidiano acolá. E de repente eu quase não narro mais. Conclui que minha vida deve estar muito sem graça, porque simplesmente não acontecem fatos a serem narrados. Ou será que acontecem e eu é que descobri que realmente não sei narrá-los? Espero que seja só uma dessas duas coisas. Porque acho que o pior de tudo é acabar vindo a descobrir que eles acontecem, e que eu até saberia narrar, mas perdi o feeling de perceber nas pequenas coisas algo de grande, que poderia virar um texto, que poderia ser digno de atenção.

Já vi aquela frase que diz que “Deus às vezes me tira a poesia da vida. Eu olho pedra e vejo pedra mesmo”. Mas acho que falta de poesia na vida tem limites, sabe assim? O que eu estou querendo dizer é que em alguns tempos áureos os textos escorregavam de mim como num parto a jato, onde eu já abria o Writer com dilatação total e de repente o cordão umbilical estava cortado. Hoje em dia a cabeça do texto só sai se eu forçar muito. O meio do texto? Só com cesárea. E eu estou pra lá de cansada de levar tanto ponto.

Lembro da emoção que era reler o texto e encontrar superlativos, mesóclises, metáforas, trocadilhos, referências. Lembro do tempo em que toda essa beleza caía no papel de forma leve. Ou do tempo em que eu tinha paciência pra sentar e escrever um texto bom, mesmo que ele demorasse 1 hora pra sair. Hoje em dia, 20 minutos de indecisões e já me dá vontade socar o teclado. E eu nem sei mais sobre o que eu estou escrevendo agora, na verdade. Acho que estou tentando entender se desaprendi a escrever, ou pior, se desaprendi a viver mesmo.

meredith

E a propósito: Não tenho a menor vontade de ler Moby Dick. Faça me o favor, mil páginas sobre baleias? Não é possível alguém ser tão bom escritor assim.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Minha cabeça é uma festa

Mais um primeiro dia de aula onde nada do extraordinariamente sonhado acontece. Acho que meu grande problema com a vida é sonhar. E mesmo achando isso, minhas palavras continuam sendo escritas sem que encostem nas linhas. Flutuam, bem como minha cabeça.

O professor está falando de crônicas e eu penso em várias que gostaria de escrever. O semestre dessa matéria vai ser divertido e tudo o que ele vai passar hoje é a ementa da matéria. Decido viajar para o futuro de novo. É. Aquele futuro que insisto em usar para fugir do presente. Aquele futuro que cisma em não dar sinais de que vai acontecer, mas com o qual eu continuo impreterivelmente sonhando:

É sábado de manhã. Estamos numa padaria. Eu, o marido e as meninas. Clara tem seus recentemente completados sete anos. Aurora espera ansiosamente a chegada dos cinco. Me lembro de quando eu esperava ansiosamente pelos cinco, só pela vontade de responder minha idade exibindo uma mão completa. Minha nostalgia é interrompida pela discussão das duas. Querem comer panquecas. As panquecas daqui são enormes e minhas filhas comem feito passarinhos. Meu marido sugeriu que dividissem a mesma, e foi aí que a encrenca começou. Clara quer a de frango. Aurora só aceita a de queijo. Não conseguimos balancear suas vontades. Desisto do meu waffle gigante para dividir a panqueca com Aurora. Marido resolve que tudo bem comer sua salada de frutas, sua omelete, e ainda arrematar o que sobrar da panqueca de Clara. Por que elas tinham que ser tão diferentes? Seria lindo se as duas gostassem de frango. Ou de queijo.

Os pratos chegam. Comem. Divido igualmente a panqueca de queijo com a pequena Aurora e ela ainda deixa no prato quase metade de sua metade. 1/4 de panqueca foi tudo o que minha caçula conseguiu comer no café da manhã. Tudo bem. Até meus 23 anos meus cafés da manhã se resumiam a um copo de toddy. Clara comeu quase metade da sua, e tão logo marido terminou o prato elas começaram a bradar pela “sobremesa”. Passamos pela estufa e logo sinto o cheiro do segundo round da confusão: Só tem um croissant de chocolate e é óbvio que nenhuma das duas quer o de doce de leite. Muito menos o de goiabada. E é igualmente óbvio que nenhuma delas vai querer dividir. Nessas horas o estômago sempre aumenta. Porque diabos essas meninas são tão iguais? Existem tantos sabores de croissants no mundo. A situação se resolve quando a moça que está em nossa frente na fila pega o croissant pra si. Clara fica irritada e Aurora faz bico. Eu faço cara de “paciência” e acabo com a história pegando uma tortuguita pra cada uma. Sorrio.

Sou trazida de volta a 2013. Sala de aula. Chove muito. Ainda não terminei meu primeiro livro do Zafón, tampouco encontrei o marido que fará parte dos devaneios acima. E o que mais me atinge, nesse momento, é que já tenho 21 anos e 3 meses. O que significa que tenho menos de 2 anos para incluir acompanhamentos  ao meu copo de toddy no café da manhã.

domingo, 21 de julho de 2013

50 coisas que vocês não precisavam saber

E daí que eu estava zambetando pela internet sem nada pra fazer, e descobri uma dessas TAGS de Youtube que consiste em você gravar um vídeo falando 50 coisas sobre você. Claro que eu resolvi fazer e instigar a máfia a fazer o mesmo.

Gravei meus quase 20 minutos de bobagens, e só no final percebi que meu cabelo estava todo despenteado, porque é fino demais e escapou todinho dos grampos. Como dignidade pouca é bobagem, no meio do vídeo eu resolvi passar a mão no olho e carregar delineador pra bochecha, que ficou meio cinza. Mas tudo bem, porque se eu gravasse de novo eu já ia estar sem paciência, então vai isso mesmo. Pra completar, depois do vídeo demorar mais de 24h pra upar, a miniatura ficou bem assim. Quer saber, chega. Divirtam-se!

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Quase amor

O Café Paris não era lá tão diferente dos outros cafés pitorescamente perdidos na cidade de São Paulo. Um toldo verde claro e canteiros de amor-perfeito protegiam as quatro mesas externas do mau-tempo e dos transeuntes por ventura mais afobados. Além disso, na lateral esquerda, bem perto da porta, ficava sempre o pequeno quadro-negro, apoiado em um cavalete, que, ao contrário dos costumeiros resumos de cardápio, exibia sempre uma citação nova. Guilherme, o dono, sempre teve certeza de que comida todo mundo sabia que iria encontrar lá dentro. Poesia é que devia ser o diferencial do mundo.

E foi lá que Lilly resolveu entrar naquele dia, quando viu que a fila do Starbucks do outro lado da rua estava grande demais pro pouco tempo que tinha. Lilly nunca tinha tempo. E resolveu que podia abrir mão de seu Frappuccino de Doce de Leite naquele dia e tomar algo mais despretensioso, mas que fizesse com que ela chegasse mais rápido ao trabalho. Entrou direto e pediu um cappuccino no copinho de plástico. Guilherme sorriu ironicamente ao perceber a pressa da menina. Disse que seus cafés costumavam ser artesanais, e que a melhor parte deles era se sentar e tomar com calma, curtindo o ambiente. Ela sorriu de volta e disse que em plena quarta-feira aquilo seria um luxo impensável. Como o freguês deveria ter sempre razão, entregou o cappuccino da moça em um copo plástico e desafiou que ela voltasse no dia que tivesse tempo. "Guilherme", ele disse enquanto ela andava apressada porta a fora. Parou, olhou de volta, sorriu: "Lilly". E se mandou sem ficar pra escutar ele dizer "Lindo nome. Significa Lírio". 

Seria bom se tivesse escutado. Lilly sempre se irritava com seu nome. Tudo bem que seus pais gostassem de lírios, mas soletrar os tais "dois eles e ípsilon" toda vez que alguém precisasse escrevê-lo não era nada prático. Isso quando não insistiam em chamá-la de "Lilí". Nada contra as Lilís do mundo, mas seu nome se pronunciava "Líli". E, puxa, certamente devia ser mais fácil se chamar Mariana. Ou Melissa, já que seus pais gostavam tanto de flor. Enfim. Ela devia ter escutado que Guilherme achou seu nome lindo. Era sempre bom.

E não que ela tivesse aceitado algum desafio, mas na sexta-feira da semana seguinte eu horário começava 1h mais tarde e, na correria de sempre, ela só lembrou desse detalhe depois que já tinha saído de casa. A fila do Starbucks estava gigante de novo, e então resolveu dar uma chance à tal "poesia" dos cafés de Guilherme.

Não soube direito dizer se o que a encantou foi a abelhinha desenhada com canela em cima do chantily de seu café. Ou se foi foi o vaso de amor-perfeito, no qual ela finalmente resolveu reparar. Se foi o fato de ter sempre uma citação escrita no quadrinho, ou o fato deles insistirem em chamar "cupcakes" de mini-bolinhos. Ou mesmo se foi o sorriso de Guilherme. Mas começou a sair sempre 1h mais cedo do que deveria, pra ter tempo de tomar poesia em seu café da manhã. E assim ela foi aprendendo o que era ter tempo. "o bom filho à casa torna", dizia o quadro-negro na terceira vez que Lilly apareceu. Um dia depois do dia em que ela chegou chorando, o quadro dizia "sorria. o mundo não merece suas lágrimas". E assim a vida se seguia.

Ela corria, Guilherme sorria. Os desenhos feitos com a canela ficavam cada vez mais produzidos. As mensagens no quadro cada vez mais diretas, e mesmo assim, ela tinha medo. Encarava aqueles olhos castanhos que estavam sempre sorrindo atrás do balcão mas não tinha coragem. Nem o dia em que ele escreveu "vamos?" ela teve segurança o suficiente pra responder "pra onde você quiser". Ele, tampouco, teve coragem de olhar pra ela e falar o que tantas vezes já tinha escrito.

3 meses depois descobriu porque que a menina tanto chorava. Iria embora. Tinha recebido uma proposta praticamente irrecusável de promoção no trabalho, mas tinha que se mudar para o Canadá. E tudo o que seu coração queria era que alguém desse um real motivo para ela recusar. Não recusou. Contou pra ele em seu penúltimo dia. No último, passou lá pela manhã e estava escrito no quadro "te amo". Mas o motivo que ela queria tinha chegado tarde demais.

Embarcou no dia seguinte e não saiu do avião como a Rachel, em Friends. Mas teve vontade de um telefona que fizesse ela largar tudo. No caso dela tinha sido uma mensagem em um quadro, mas ela cismou em não acreditar totalmente. Ele nunca ligou. Ela nunca saiu do avião. E 10 anos depois... bem, os dois se resolveram. Sozinhos e com outras pessoas. Ela casou com um médico canadense, que conheceu no dia em que teve uma úlcera de tanto tomar café. Ele não sabia que Lilly significava Lírio, mas tudo bem também. No dia em que ele mandou a primeira mensagem no celular dela dizendo "te amo", ela lembrou do "te amo" do quadro-negro. E imaginou quantas vezes Guilherme já não teria escrito aquilo para as outras. Quem sabe pra uma que realmente tivesse coragem de acreditar.

Guilherme, por sua vez, se casou também. Com outra moça que vivia enfiada em seu café, e que um dia se levantou de sua mesa, escreveu "te amo" no quadro e entregou pra ele, dentro do balcão. Ele sorriu. Chamou ela pra um cinema e dividiram a pipoca doce. Mas colocou o quadro no lugar pensando que nunca mais escreveria "te amo" ali para ninguém.

Os amores, às vezes, não são eternos. A consumação do amor faz com que ele se torne real, e por isso, tenha a chance de acabar. Mas os "quase amores", ah, esses são pra sempre. Não têm como morrer. Então apenas nascem. Em cafés, desenhos de canela, vasos de amores-perfeitos ou quadro negros. No fim das contas um "te amo" escrito a giz pode ser muito menos efêmero do que qualquer um possa pensar.

sábado, 13 de julho de 2013

Eu queria muito ter amado

Quando ouvi rumores de que J. K. Rowling estava aparecendo por aí com um livro eu fiquei com uma sensação muito dúbia no meu peito. Era uma alegria imensa de poder ler algo dela de novo, e um pavor imenso de imaginar ela escrevendo alguma coisa que não fosse Harry Potter.

Admiro. Claro que ela tem o direito. Ninguém quer ser marcado por “uma obra só”. E por isso eu fui deixando o barco correr. Olhava o livro e não comprava. Esperava pelo momento onde eu ia ter muita vontade de lê-lo. Pedi de aniversário e ganhei. Coloquei em cima da escrivaninha e esperei. Até que, ainda no meio da leitura de “Olhai os lírios do campo”, olhei de relance pra escrivaninha e ele gritou pedindo atenção. E eu ouvi.

Terminei Érico Veríssimo na maior correria, tamanha vontade de aproveitar aquela ansiedade súbita para finalmente ter um J. K. Rowling de novo nos meus braços e devorá-lo. Quando finalmente comecei o livro, olhei várias vezes para o nome na capa e lembrei de cada Harry Potter que eu esperei ansiosamente ter sido lançado. Prometi a mim mesma que ia apagar esse registro e ler sem fazer comparações. E consegui. Não pelo mais nobre dos motivos.

Essa leitura pra mim foi um gráfico. Quando comecei, viciei e achei que leria de uma vez. Mas ele oscilava muito. Perdia o sentido várias vezes. Aqueles milhões de personagens me deixavam maluca. Ao contrário das pessoas tão vivas que Harry Potter colocou na minha vida, as pessoas de Morte Súbita me pareciam vazias, sem aprofundamento nenhum. Consegui angariar um núcleo favorito, e os únicos momentos onde eu conseguia me entregar de verdade à leitura para esquecer da vida real eram onde esses personagens apareciam. No caso, o drama de Terri, Robbie e Krystal, com um dedinho de Kay, Gavin e Gaia. Dei umas risadas com Samantha e odiei Obbo com todas as minhas forças. E só. De resto, um enorme vazio. Parminder não me convenceu. Colin não me convenceu. Mary não me convenceu, e o chato do Simon menos ainda.

Consegui me envolver um pouquinho nas confusões e intrigas que rodeiam eleições de cidade do interior, e achei o máximo os adolescentes aprontando enquanto os adultos se descabelavam para descobrir quem era o grande mentor por trás das sacanagens virtuais. Mas a superficialidade dos personagens insistia em me afastar da história.

O fato é que ainda me pego chateada de dar 3 estrelas pra J. K. Rowling. Gostei de seu livro, e só. Terminei louca pra terminar, porque já não aguentava mais olhar pra capa dele toda hora. Li um livro do Antônio Prata em menos de 48 no meio da leitura dele. Não ataquei o livro quando ele saiu, tentei esperar nosso momento. E mesmo assim não rolou. Tem nada não. J. K. pra mim sempre será J. K., e nunca terei papas na língua ao dizer, sem receio, que minha vida vale a pena porque existe Harry Potter. Meu coração agradece silenciosamente a ela pela infância, adolescência e lições de vida que ela me deu de presente criando o fantástico mundo de Hogwarts e tudo o mais. Mas com Morte Súbita não rolou. E, meu Deus.

foto

Como eu queria ter amado

quarta-feira, 10 de julho de 2013

O resto é silêncio

Já contrariei Amélie Poulain, balançando a cabeça bem contrariada e afirmando que para os verdadeiros sonhadores os tempos nunca ficariam realmente difíceis. Hoje já não acho. Acho que ficam difíceis sim; que até os sonhadores às vezes passam por seus doloridos momentos de não acreditar em milagres por hoje. E ainda digo mais: Os tempos se tornam mesmo difíceis, porque para os sonhadores dói ainda mais não acreditar mais.

É dolorido demais de engolir a vida te dando umas bordoadas desnecessárias quando você acredita tanto nela. Parece ingratidão. E parece que continuar acreditando traz o peso de um suicídio. Rasga a alma acreditar tanto e ver que as coisas não acontecem. Chega uma hora que fica pesado aceitar que as mais sonhadas batalhas só são conquistadas embaixo do chuveiro, onde a gente afoga o que não convém. A terra firme sufocando de volta após o fim do banho traz consigo mais gelo na espinha. A gente chora. Tenta limpar as próprias lágrimas, a própria alma, e pede a si mesmo pra conseguir se consertar.

Tem dias que o mundo dos sonhadores também perde as cores e as luzes. Apagam tudo, pintam de cinza, e se para as outras espécies de mortais, aquelas que não sonham, ver tudo cinza já é complicado, imaginem para os tais iluminados e coloridos sonhadores inveterados. O mundo vira um borrão e a gente jura que desistiu de tentar clarear. Jura que não vai mais tentar acender as próprias luzes. Sabemos que mais dia menos dia, elas vão se acender sozinhas. Mas nesses dias, enquanto isso ainda não acontece, o jeito é aceitar conviver com o peito gritando e turbilhando. E quando o mundo grita tanto para o lado de dentro, o que tá de fora é só resto. E o resto é silêncio.

amelie

Silêncio.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Um relicário imenso de infinitos

Os sonhos mais legais de realizar são aqueles que, pelo fato de não colocarmos muita fé, nem nos esforçamos sonhando tanto. Eles ficam ali. Quietinhos, intrínsecos na alma, e de repente, se realizam. Como num passe de mágica. A vida às vezes parece um passe de mágica, e se existe a tal da lei de Murphy que faz tudo dar errado da pior maneira possível, existe também a não tão comentada lei sem-nome, que faz tudo dar muito certo da melhor maneira possível.

Ano passado, antes de agosto, não acreditava de coração que um dia seria possível um encontrão da máfia. E ele aconteceu. E mesmo com o destino sambando na minha cara e mostrando que as coisas são possíveis eu teimava em não pensar a sério no assunto de acreditar ser possível um dia eu ter essas meninas em uma estreia de peça minha.

Não contente em me permitir estrear um musical (logo eu, que não cantava nem “o cravo rosa” em público, tamanho o desespero), o destino ainda resolveu que seria legal mandar umas pessoas bacanas pra assistirem. Uma que resolveu vir, então duas, e de repente eu avisei pra minha mãe que sete pessoas estariam vindo se hospedar em nossa casa. Era inacreditável. Era muita realidade para um sonho só. E aconteceu.

É difícil até enumerar tudo o que ocorre nesse tão intenso e curto tempo no qual as coisas realmente acontecem. Sei que no dia 27 de junho, uma quinta-feira fria, eu cheguei maravilhada de um ensaio belíssimo, que rolou depois de finalmente termos terminado de fazer o cenário. Tomei banho, cantei pelo quarto, e fui dormir ansiosa por tudo o que viria. Levantei da minha cama às 6h30 pra ir ao aeroporto e só voltei para ela no dia 3 de julho às 5h30, quando as últimas duas foram embora e deixaram uma casa vazia e gelada para trás.

Minhas amigas vieram. E eu estreei um musical com elas na primeira fila. Elas passaram um sábado aflitivo comigo andando de um lado pro outro, e tentavam conversar e fazer piadas enquanto me empurravam comida goela baixo e me viam de pé com o olhar sem rumo de tanto desespero. Cantaram Taylor Swift no carro comigo, conseguindo me desestressar um pouco. Rolaram no chão em meio a presentes fofos que ganhamos de uma certa amiga talentosíssima. Me desejaram merda-merda pessoalmente, e me viram sair de casa às 17h com um iceberg dentro da barriga pra cantar em cima de um palco. Comeram pizza comigo pós-estreia, falaram da peça com lágrimas nos olhos, me apertaram chorando agradecendo pela maravilha que elas tinham ido assistir. Ora essa, quem sou eu! Maravilha foi tê-las na plateia.

Tudo o que é bom dura o tempo necessário para se tornar inesquecível. E se alguns infinitos são maiores que outros, só tenho a reafirmar o que Rafinha disse tão sabiamente: Ok, temos mais 1 ano separadas pela frente, mas o que é 1 ano separada perante aos 3 maravilhosos dias que passamos tão juntas? E digo mais: Nunca ficamos 1 ano separadas. Alma não se separa.

Na quarta-feira às 5h30 da manhã, quando eu me deitei na minha cama de novo após esses dias, eu fiquei quieta olhando pro teto e pensando que era incrível que só haviam se passado 5 madrugadas desde que eu tinha levantado dela. E pensei que eu vivo achando que anos se passam e minha vida não sai do lugar, e que nada muda. E meu Deus, quantos sonhos podem ser realizados em 5 dias. Quantos relicários de amor não são construídos em 5 dias. E... quantas vezes eu preciso agradecer ao universo por ter me dado de presente pessoas tão especiais?

22
We’re happy, free, confused, lonely at the same time

terça-feira, 2 de julho de 2013

Histórias da estreia de Histórias

E aconteceu da maneira que eu imaginava. Uma semana cansativa e estressante, que começou com lágrimas, rendeu crises existenciais e artísticas até onde elas não mais cabiam, e terminou com aquela sensação de leveza no coração.

No meio da semana, sentada em uma cadeira sem esboçar reação nenhuma, eu olhava reto e me perguntava o que diabos eu estava fazendo neste lugar. Meu sonho era saber física, entender tudo de matemática e me enfiar numa sala de aula de engenharia onde as contas só tem como dar certo ou dar errado e pronto. Essas histórias subjetivas do lado artístico da vida deixam qualquer um maluco, e eu, que não tenho estrutura emocional nenhuma, me perguntava com o coração apertado o que eu tinha vindo fazer aqui mesmo.

Gritei socorro pra amiga, que disse que agora já não dava tempo de voltar atrás, porque eu já estava de joelhos no altar. A daminha caminhava com a aliança e eu estava morrendo de medo de coloca-la no dedo e não fazer direito. Acontece que independente disso eu sabia o quanto eu amava aquele homem e sabia que, por mais medo que eu tivesse de estar no lugar errado, o amor fazia tudo valer a pena. E eu sempre soube que seria assim.

Na minha cabeça se passava um filme de todas as outras estreias. Cada crise, cada desespero, cada medo do fracasso total e cada coração apertado. Uma outra amiga me mostrou uma frase, escrita em um quadro de nossa sala, que diz que o desejo sempre supera a fragilidade. E mesmo na certeza de que eu estava nadando a esmo naquele mar, e morrendo pra bater aqueles braços achando que eu ia me afogar, eu via que no final tinha um filete de areia no qual ia dar pra se segurar.

E foi assim. Ensaio ruim em um dia, bom no outro, coração apertado, coração recheado, força que vinha de onde não sabíamos, cenário que aparecia pronto depois de uma tarde chapada de tinta. No sábado passamos o dia quicando, sentindo icebergs na barriga e no coração, e eu, calada na parede do camarim, me perguntava novamente onde eu estava com a cabeça quando tinha resolvido me enfiar nessa roubada.

Mas já de figurino, na coxia, de mãos dadas com minha amiga e escutando o público entrar, a gente se abraçou e se olhou em nossa 5ª estreia juntas e pensou que, no fim das contas, era isso. Os minutos antes de subir no palco eram a enorme subida da montanha russa, onde bate o desespero e a vontade de descer logo, ao mesmo tempo. É a adrenalina mais deliciosa do mundo, e mesmo quase chorando de medo e de amor ao mesmo tempo, 1 segundo antes de entrar no palco nós reafirmamos a certeza que nosso coração já tinha: “Não dá pra viver sem isso”. E que bom que não dá. 

Parafraseando a Airen, que, por sua vez, parafraseou Cazuza, também não consigo ver o amor como um abraço curto pra não sufocar. Amor é um abraço muito longo. Que sufoca sim. Mas cola um coração no outro, e reiterando com Florbela, essa é a única razão que eu vejo na vida, porque todo o sentido de tudo está em amar só por amar, aqui e além. Mesmo que muitas vezes você esqueça o tamanho do amor quando estiver enfiada até o talo na crise.